Do Serviço Noticioso Um Mundo A Ganhar (SNUMAG) de 19 de Junho de 2006, aworldtowinns.co.uk

Série: O Irão e a ameaça de uma nova guerra

IV – Os planos dos EUA e as suas contradições

Os planos dos EUA em relação ao Irão e a essa região já foram discutidos nesta série de artigos, mas vale a pena examinar em mais detalhe dois dos vários problemas que enfrentam.

O primeiro é a oposição das massas do mundo bem como do seu próprio país. Os povos do mundo e dos EUA já souberam das mentiras sobre as armas de destruição em massa. Desde o início da guerra no Iraque que mais gente tem compreendido os objectivos e as intenções do governo Bush. As coisas não vão bem para os EUA e seus aliados e o inferno que a ocupação liderada pelos norte-americanos criou ao povo iraquiano está aí para ser vista por quem tenha olhos. Isto tornará mais difícil fazer com que as pessoas engulam mais falsidades norte-americanas.

Além disso, uma nova geração de jovens politizados e que se opõem, entre outras coisas, às guerras de agressão, emergiu na vida política dos países ocidentais e do mundo em geral. Nas vésperas da invasão do Iraque, uma estudante de Londres exprimiu o seu sentimento de “devastação sobre o caminho que a política mundial está a seguir”. Essa foi uma declaração muito sincera e forte que representa os sentimentos de muita gente. Depois, há os milhões de jovens e outras pessoas dos países oprimidos, sobretudo dos que são predominantemente muçulmanos, que estão ultrajados e enfurecidos com a subjugação e a humilhação norte-americanas.

A outra preocupação principal dos EUA é fazer com que todas as outras grandes potências alinhem no seu plano, ou pelo menos que o aceitem. Porém, isso também pode vir a não ser tão fácil. As diferenças entre elas não são apenas diferenças de perspectivas mas reflectem interesses contraditórios. No ano passado, os EUA conseguiram formar com a Europa uma frente diplomática unida contra o Irão, num acordo de bastidores. O seu conteúdo nunca foi tornado público, mas não é difícil adivinhar que o acordo envolveu negociatas à custa dos povos. Contudo, até agora, os EUA não conseguiram obter o grau de aceitação que queriam da Rússia e da China (que não é um país capitalista monopolista / imperialista, mas tem os seus próprios interesses de grande potência). A Rússia e a China recusaram-se a assinar uma proposta de resolução que poderia ter imposto sanções imediatas ao Irão. John Bolton, o embaixador dos EUA na ONU, ameaçou que “os EUA e os seus aliados europeus poderiam avançar sozinhos com as sanções” (Guardian, 4 de Maio). No caso de haver sanções contra o Irão, a Europa também será uma grande perdedora. Confiará ela nos EUA para a compensar adequadamente e satisfazer o que ela entende serem os seus próprios interesses no Médio Oriente?

Além disso, a cooperação entre os EUA e a UE não durará necessariamente para sempre, e a sua cooperação até agora não significa necessariamente que alinhará totalmente com os EUA na guerra. Há sinais de oposição ou pelo menos de discordância entre a Europa e os EUA relativamente ao uso de força contra o Irão – se, quando e como deve ser usada. Afinal, no essencial, as grandes potências europeias estão muito pouco ansiosas por verem os EUA atingirem os seus objectivos de tornar o Irão numa praça-forte norte-americana na região. Os EUA tentaram mantê-las do seu lado alegando que uma vez que elas não conseguem impedir os EUA, seria melhor juntarem-se a eles. Se se opuserem a um ataque dos EUA ao Irão, elas temem vir a ser completamente esquecidas quando chegar a altura de dividir os despojos, incluindo os contratos de petróleo e a influência.

A Grã-Bretanha, por causa dos seus interesses económicos e políticos muito ligados aos EUA, é algo diferente da Europa continental. O primeiro-ministro Tony Blair tem apoiado Bush, recusando-se a afastar a hipótese de um ataque ao Irão. Contudo, nem mesmo depois da demissão do Secretário britânico dos Negócios Estrangeiros, Jack Straw, que defendia publicamente que um ataque militar contra o Irão era “inconcebível”, essa ideia está de modo algum isolada entre a classe dominante britânica ou mesmo no próprio governo Blair. A França, embora endurecendo o seu tom contra o Irão, acentuou a sua oposição a uma acção militar. O primeiro-ministro francês Dominique de Villepin disse numa conferência de imprensa a 4 de Maio: “A minha convicção é que uma acção militar não é a solução” (Guardian). A Alemanha tomou uma posição ainda mais cautelosa contra uma acção militar contra o Irão. Um jornalista do International Herald Tribune escreveu: “Contudo, com muitos alemães e outras pessoas alarmadas com os relatos de que os EUA encaram um possível ataque militar a instalações nucleares iranianas, [a chanceler alemã] Merkel enfatizou a necessidade de uma diplomacia paciente. ‘É crucial, se queremos ver este assunto tornar-se num sucesso diplomático, fazer isto de facto numa base do passo a passo’, disse ela. ‘Muito frequentemente, são feitas tentativas para apressar os assuntos para, de facto, esvaziar o que deveria estar apenas no fim do processo’.” (5 de Maio de 2006)

A chanceler alemã foi deliberadamente ambígua. Por um lado, ela parece estar a dizer, sim, precisamos de uma guerra, mas não ainda. Por outro lado, ela pode estar a tentar usar a unidade com os EUA na diplomacia como a única forma de fazer abrandar ou impedir um ataque. A diplomacia pode ser uma faca de dois gumes, tanto uma forma de os EUA obterem o apoio dos imperialistas europeus como uma forma de a Europa tentar influenciar os EUA.

Estas diferenças vão-se interpenetrar com os desenvolvimentos políticos à escala mundial que se seguirão a qualquer desencadear de uma nova guerra.

As diferenças dentro do poder político nos EUA

Também há diferenças sobre a política face ao Irão dentro da classe dominante dos EUA. Elas são de uma natureza diferente e reflectem não interesses políticos ou económicos contraditórios mas antes disputas sobre que política e que abordagem serviria melhor no global os interesses do capitalismo monopolista norte-americano.

Quando George Bush, no seu discurso do Estado da União em 2001, incluiu o Irão no eixo do mal, ao lado do Iraque e da Coreia do Norte, todos os responsáveis em Washington aplaudiram entusiasticamente durante longos minutos. Contudo, embora a classe dominante dos EUA parecesse muito unida ao entrar na guerra contra o Iraque, as vozes de diferentes sectores dos círculos políticos imperialistas norte-americanos estão longe de formar um coro unido em relação à acção militar contra o Irão. Enquanto alguns estão a fazer pressão para um rápido início da guerra, outros sugerem uma abordagem mais cautelosa e ainda outros estão claramente a avisar para as suas consequências. As perspectivas opostas e os planos em relação ao Irão e à região estão a começar a aparecer na imprensa, motivados em grande grau pelos obstáculos que os EUA enfrentam no Iraque.

A verdade é que todas as facções estão unidas numa coisa: que a única questão que interessa resolver é como defender os interesses norte-americanos à escala mundial. Eles partilham o mesmo ponto de partida: os EUA têm que provocar mudanças dramáticas na situação do Médio Oriente, sobretudo no Irão, de forma a consolidarem e assegurarem o seu domínio mundial e a responderem a qualquer ameaça, seja dos povos oprimido ou de outros imperialistas e forças reaccionárias – tudo em nome de protegerem a paz e a democracia.

As dissidências dentro dos círculos norte-americanos do poder ficaram aparentes com a publicação em Abril deste ano do artigo da revista New Yorker e de outros relatos que detalham os preparativos militares secretos dos EUA para atacarem o Irão. Essas fugas de informação tinham por objectivo assinalar a gravidade da situação a quem defendia a ideia de que a possibilidade desse ataque era demasiado forçada para ser levada a sério. Elas tiveram um grande impacto, alarmando as pessoas em todo o mundo.

Mas os conselheiros políticos dos EUA têm andado a flutuar a ideia desse ataque há já vários anos e a avisar que qualquer atraso pode ser contra os interesses norte-americanos. Por exemplo, no artigo “O Projecto Manhattan dos Mulás” que apareceu em Junho de 2003, imediatamente a seguir à invasão norte-americana do Iraque, Reuel Marc Gerecht do American Enterprise Institute argumentava que se os EUA se afastassem da ideia de desencadear rapidamente um “ataque preventivo contra as instalações nucleares do [Irão]... então acabou a doutrina do ‘eixo do mal’.” Muito significativamente, ele também dizia que os EUA deveriam enfrentar o facto de que um ataque aéreo poderia levar a uma guerra total com a duração de muitos anos porque, uma vez “ferido”, o regime iraniano poderia ficar ainda mais desesperado e perigoso (aei.org). Gerecht repetiu recentemente essa ideia e disse que a probabilidade de um ataque aéreo ao Irão se tornar numa guerra total é uma das razões para os EUA se prepararem para essa guerra e não para a evitarem ainda mais (BBC / Página internet em persa, 9 de Abril).

Esse apelo à guerra está a ser crescentemente dirigido à opinião pública em geral. A nomeação por Bush de John Bolton como Embaixador dos EUA na ONU teve esse objectivo. Além de estar associado ao American Enterprise Institute, Bolton é conhecido como um defensor da mudança de regime. Ele era tão extremista na defesa de um confronto imediato com a Coreia do Norte que foi afastado da equipa de negociações dos EUA quando foi tomada a decisão de, em vez disso, perseguirem o Irão. Num discurso à convenção anual do Comité de Assuntos Públicos Americano-Israelitas, ele disse: “Quanto mais muito tempo esperarmos para enfrentar a ameaça que o Irão representa, mais difícil e intratável de resolver se tornará... Nós temos que estar preparados para aplicar soluções globais e usar todos os meios à nossa disposição para travar a ameaça que o regime iraniano representa.” (Guardian, 6 de Março) Uma “solução global” quer dizer o uso da força e “todos os meios à nossa disposição” inclui armas nucleares. No que diz respeito à alegada ameaça iraniana, mesmo que o Irão realmente tente produzir algumas bombas nucleares numa década ou duas, isso não é uma grande ameaça para os EUA ou para um mundo já ameaçado por mais de 25 000 ogivas nucleares nas mãos de comprovados belicistas. De facto, a ameaça de que ele fala é o obstáculo que a República Islâmica do Irão na sua actual forma representa para os interesses dos EUA no Médio Oriente e ao modo como a incapacidade de os EUA conseguirem até agora uma “solução global” tem incentivado o desafio dos seus rivais imperialistas aos interesses norte-americanos.

Um apelo semelhante veio de Newt Gingrich, um antigo líder do Congresso dos EUA e actual membro da Comissão de Política de Defesa do Pentágono: “Cada ano que aguardarmos, o risco aumenta... eu esperaria que a administração se decidisse a fazer algo de decisivo... Nós teremos o poder militar na região se precisarmos dele. É uma questão de sabermos se temos a determinação.” (Washington Post, 13 de Março)

Estas declarações públicas dos falcões desencadearam uma gama de diferentes graus de preocupação entre os representantes da classe dominante dos EUA. Alguns relatos sugerem que há diferenças entre o Pentágono e o Departamento de Estado. Por exemplo, uma comissão de relações exteriores do Parlamento britânico que este ano visitou Washington no início de Março “encontrou perspectivas apuradamente diferentes dentro da administração Bush. A mais extrema veio do Sr. Bolton. Segundo Eric Illsley, um membro trabalhista da comissão, a CIA parecia ser muito céptica em relação a uma solução militar e partilha a posição do Departamento de Estado, dizem os parlamentares britânicos, ao sugerir um aumento gradual da pressão sobre os iranianos. A posição do Pentágono foi descrita pelo presidente da comissão, Mike Gapes, como a de lançar a exigência de um embargo imposto militarmente ao Conselho de Segurança ‘como uma granada de mão – para ver o que é que acontece’.” (Guardian, 6 de Março)

O semanário britânico The New Statesman acredita que “as armas nucleares, contudo, são uma outra questão. Se elas podem ser usadas contra o Irão é uma questão crítica na luta que decorre entre os pragmatistas da política externa e os fanáticos ideológicos. Washington está dividida entre estes dois campos... Mesmo Condoleezza Rice, a Secretário de Estado, está em desacordo com Donald Rumsfeld, o Secretário da Defesa.” Um dos mais fortes indícios de dissidência apareceu numa carta aberta assinada por vários antigos ministros dos negócios estrangeiros ocidentais, incluindo a ex-Secretária de Estado dos EUA, Madeleine Albright. Avisava: “A administração Bush pode estar a planear activamente desencadear em breve ataques militares contra possíveis instalações de armas nucleares do Irão... É duvidoso que um ataque aéreo ‘cirúrgico’ possa ter sucesso na destruição total dos recursos nucleares do Irão, ao mesmo tempo que uma vasta invasão e ocupação militar do país é amplamente reconhecida como irrealizável... Os potenciais riscos do uso da força são suficientemente sérios para que nós apelemos aos EUA que, em vez disso, procure primeiro uma corajosa opção não militar.”

A preocupação com a pressa numa acção militar foi levantada publicamente mesmo dentro do próprio Partido Republicano de Bush pelos Senadores Republicanos Sam Brownback e Richard Lugar e pelo ex-Secretário de Estado Adjunto Richard Armitage.

Uma fonte de oposição particularmente forte tem sido Zbigniew Brzezinski, Conselheiro de Segurança Nacional do Presidente Jimmy Carter e uma importante figura entre os decisores imperialistas dos EUA, em especial durante a Guerra Fria. Numa conferência pública em Abril em que avisou directamente o Presidente Bush e a sua clique sobre consequências e perigos, argumentou: “há quatro razões imperiosas contra um ataque aéreo preventivo às instalações nucleares iranianas”. Uma é que, uma vez que o Irão está a anos de produzir uma bomba, não há nenhuma “ameaça iminente”. A segunda é que, dada a situação dos EUA no Iraque e a capacidade iraniana de encaixe numa região já difícil, “um conflito com eles faria o desastre do Iraque parecer trivial”. A terceira é que haveria outra crise petrolífera e “a economia mundial seria severamente atingida, com a América a ser acusada disso”. A quarta é que “a América tornar-se-ia alvo do terrorismo com uma probabilidade ainda maior, com a maior parte do mundo a concluir que o apoio da América a Israel é a principal causa do crescimento do terrorismo. A América ficaria ainda mais isolada.”

E concluiu: “Em suma, um ataque ao Irão seria um acto de loucura política, pondo em marcha uma progressiva convulsão nas questões mundiais. Com os EUA a serem cada vez mais objecto de uma hostilidade difundida, a era da preponderância norte-americana poderia mesmo vir a ter um fim prematuro. Embora os Estados Unidos sejam claramente preponderantes no mundo actual, não têm nem o poder nem a inclinação interna para impor e depois manter a sua vontade face a uma resistência prolongada e dispendiosa. Essa é certamente a lição aprendida nas suas experiências no Vietname e no Iraque.” (Tribune Media Services, 26 de Abril)

O próprio Brzezinski acredita na validade estratégica dos dois argumentos fundadores da política de Bush que ele critica tacticamente. Numa conferência anterior em Outubro de 2003, ele disse: “No caso do Irão também é do nosso interesse o enfraquecimento do despotismo teocrático”. Ele também reconheceu que a velha ordem mundial que emergiu da Guerra Fria já não é aceitável e que seria errado procurar a paz e a estabilidade antes de uma nova ordem estar consolidada. “Nós vamos viver num mundo inseguro. Não o podemos evitar. Temos que aprender a viver nele com dignidade, idealismo e firmeza.” (Comentários feitos na Conferência Novas Estratégias Norte-Americanas para a Segurança e a Paz, The American Prospect Online, 31 de Outubro de 2003).

De facto, quaisquer que sejam os perigos, a necessidade de uma redivisão do mundo é uma força determinante que impele o imperialismo norte-americano a desencadear guerras, sobretudo, agora, no Médio Oriente, o centro de qualquer redivisão global.

Depois do colapso do bloco soviético, a divisão do mundo baseada na anterior situação não consegue satisfazer um imperialismo norte-americano que emerge como a única superpotência militar. Como escreveu Lenine, o capitalismo desenvolve-se desigualmente e isso origina continuamente desafios à divisão do mundo existente, da parte de imperialistas rivais que procuram ampliar as suas esferas de influência e assegurar superlucros para o seu capital exportado. Os EUA procuram assegurar o seu predomínio antes de virem a ser ameaçados por outras forças imperialistas. O surgimento da União Europeia, o possível reaparecimento da Rússia como potência influente e as ameaças à posição dos EUA no mundo vindas de imprevisíveis alianças imperialistas anti-EUA, são o que está por trás do raciocínio dos que insistem no apressar da guerra contra o Irão. Face às críticas suscitadas pelos problemas que os EUA enfrentam no Iraque, eles alegam que a única forma de afastar os obstáculos ao domínio norte-americano do Iraque é derrubar o regime do Irão. A necessidade de reestruturar o Médio Oriente é tão crucial no seu projecto de consolidação da hegemonia global norte-americana que os governantes capitalistas monopolistas dos EUA estão dispostos a arriscar muito – mesmo a “preponderância norte-americana” na sua actual forma – e a seguir a lógica do “tudo ou nada”. É realmente verdade que Bush e a sua clique estão dementes, que estão a brincar com o fogo e a ameaçar mergulhar o mundo inteiro nas labaredas da guerra, mas essa demência segue a lógica do capitalismo na sua fase imperialista.

Embora haja uma grande pressão que obriga o imperialismo norte-americano a apressar uma solução militar para os seus problemas no Irão e no Médio Oriente, antes que seja “demasiado tarde” para eles, seria um erro ignorar completamente as contradições e limitações que ele enfrenta e as tendências opostas que surgem da sua compreensão dessas contradições e limitações.

Por exemplo, como salientaram Brzezinski e Albright, entre outros, embora um ataque militar esteja certamente dentro da capacidade do imperialismo norte-americano, os seus resultados, nessa região explosiva, poderiam facilmente ir muito além da capacidade de quem quer que seja para os controlar. O impacto poderia ser a uma escala mais vasta que uma guerra total contra o Irão. O seu resultado imprevisível é exactamente o que preocupa os pensadores imperialistas que alegam que um ataque ao Irão seria “um acto de loucura política” que poderia muito bem fazer chegar ao fim a “era da preponderância norte-americana”.

Afinal, os EUA não conseguiram atingir os seus objectivos na guerra da Coreia durante os anos 50. Como indica Brzezinski, os EUA estavam determinados a vencer no Vietname. Enviaram mais do dobro do que o número de tropas actualmente no Iraque e estenderam a guerra ao Camboja, mas isso não os salvou de uma derrota às mãos dos povos da região, com o movimento contra a guerra, sobretudo entre as forças armadas dos EUA, a desempenhar também um papel fundamental.

As consequências dessa derrota humilhante foram ficando mais evidentes à medida que o tempo passou. Facilitou o avanço do social-imperialismo soviético (socialista nas palavras mas capitalista-imperialista na realidade) à escala mundial. Também contribuiu para o surgimento de uma nova geração de activistas anti-imperialistas, muitos dos quais se juntaram ao movimento comunista, e deu um ímpeto vital às lutas populares revolucionárias em todo o mundo. Essa derrota foi um grande golpe na credibilidade da tirania norte-americana e um golpe ainda maior na confiança e na capacidade do imperialismo norte-americano para levar a cabo outra guerra como a do Vietname. Durante anos, o “espectro” do Vietname tirou o sono aos imperialistas norte-americanos. Fez com que demorasse décadas até recuperarem a sua confiança e isso só ocorreu depois do colapso do bloco soviético. A sombra da sua derrota no Vietname ainda obscurece os céus do imperialismo norte-americano.

Contudo, apesar dos seus esforços para exorcizarem essa memória e para evitarem ficar atolados em guerras locais, os EUA enfrentam agora os mesmos problemas no Afeganistão e no Iraque. A principal diferença, e uma diferença que é extremamente importante, é que as forças envolvidas na resistência iraquiana são muito diferentes e têm sérias fraquezas intrínsecas. Por causa da preponderância de forças reaccionárias muito recuadas, essa resistência não tem conseguido unir o povo e confiar no seu apoio organizado e continuado e, de facto, nem sequer o tenta fazer, apesar do muito que o povo odeia a ocupação. A recusa do povo em ajudar os ocupantes é a principal razão por que os EUA recorrem à tortura e tentam aterrorizar a população no seu todo. Mesmo assim, os EUA parecem estar a enfrentar uma guerra prolongada nesses dois países. Quando os imperialistas preocupados como Brzezinski recordam o Vietname e avisam que, no Irão, “os Estados Unidos não têm nem o poder nem a inclinação doméstica para impor e depois manter a sua vontade face a uma resistência prolongada e dispendiosa”, eles estão a referir-se, entre outras coisas, ao perigo de uma instabilidade política nos próprios EUA.

Embora não estejam alheados desses perigos, os imperialistas norte-americanos no seu conjunto, sobretudo os que estão agora no governo norte-americano, parecem sentir que a guerra é a única forma de romper decisivamente com o “síndroma do Vietname”. Eles parecem acreditar que o colapso do bloco soviético e a sua situação sem paralelo como única superpotência lhes dá a oportunidade e suficiente ânimo para verem a sua campanha pela hegemonia mundial atingir os seus objectivos. Esse resultado, acreditam eles, seria mais que compensador dos seus custos. É uma questão de vida ou morte para o imperialismo norte-americano.

Em suma, o que é certo é os EUA já terem começado a sua marcha para assegurarem a hegemonia em todo o mundo. Começaram por ocupar o Afeganistão e o Iraque e, enquanto puderem, certamente não vão parar a meio caminho. Eles estão à espera da oportunidade mais próxima possível para darem o que esperam sejam passos ainda mais decisivos. Entretanto, tentam avidamente neutralizar as forças adversárias, por exemplo unindo-se a forças imperialistas rivais e intimidando as massas da sua “pátria” e por aí adiante, ao mesmo tempo que aumentam a pressão sobre o seu próximo alvo: o Irão. O resultado final depende do desenvolvimento dos muitos e diferentes factores envolvidos nesta situação complexa. Certamente que um factor muito importante é a reacção e a orientação das massas populares dos vários países. Isso requer que os revolucionários e os comunistas participem activamente e dirijam, ao mais alto grau possível, a resistência contra a “loucura” e o terrorismo que os imperialistas se estão a preparar para desencadear.

Série: O Irão e a ameaça de uma nova guerra
Introdução
I – O que querem os EUA
II – Possíveis tácticas dos EUA em defesa dos seus objectivos estratégicos no Irão
III – O regime iraniano
IV – Os planos dos EUA e as suas contradições
V – O que os povos precisam de fazer

(Série completa disponível em formato PDF: )

 

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