Estes artigos foram traduzidos pela paginavermelha.org da edição n.º 369, de 12 de Janeiro de 2015, do jornal Revolution/Revolución, voz do Partido Comunista Revolucionário, EUA (revcom.us).

Sobre os acontecimentos em Paris

10 de Janeiro de 2015
(Fonte: revcom.us/a/369/on-events-in-paris-en.html em inglês e revcom.us/a/369/sobre-los-acontecimientos-en-paris-es.html em castelhano)

Na quarta-feira, 7 de Janeiro, 12 pessoas foram mortas e 11 ficaram feridas num ataque contra a revista satírica francesa Charlie Hebdo. Até este momento ainda não houve nenhuma declaração oficial a reivindicar a responsabilidade ou a dar uma explicação para esta acção. Neste momento, as pessoas que as autoridades afirmam ser responsáveis por esta acção foram mortas, ainda que em Paris continue a haver rusgas e repressão em massa. E mesmo que essa declaração tivesse sido emitida, ou mesmo que seja emitida em breve, ninguém deve assumir como verdadeiras as explicações e alegações dos meios noticiosos e dos dirigentes governamentais.

Mas algumas coisas SÃO claras:

PRIMEIRO: Assassinar pessoas para exprimir discordância é uma afronta. Isto é verdade independentemente de quem o faz — quer sejam os próprios imperialistas (que têm uma longa história, incluindo neste país, de actos contra a luta de libertação dos afro-americanos, tal como em todo o mundo, de silenciar e, sim, de assassinar os seus críticos), quer sejam aqueles que alegam opor-se-lhes.

Tendo em conta os acontecimentos de Paris, voltamos a publicar o seguinte artigo publicado originalmente em Setembro de 2014 (A Comment on Events in Syria and Iraq/Un comentario sobre los sucesos en Siria e Irak).

Um comentário sobre os acontecimentos na Síria e no Iraque

Qualquer ideologia ou conjunto de convicções que não consegue aguentar críticas e que denuncia as pessoas que discordam dela como “hereges” e mata ou de alguma forma tenta silenciar essas pessoas que discordam dela, é uma ideologia cobarde e falida e à qual ninguém deve ter qualquer ligação...

Hoje, os representantes dos EUA exprimem choque e indignação perante estas tácticas. Mas fundamentalmente, para os EUA e outros imperialistas, apoiar ou não este tipo de fascismo fundamentalista religioso é uma questão de gosto — o único critério deles é saber se isso funciona a favor, ou contra, a forma como eles vêem os seus interesses numa dada situação. Pensem na Arábia Saudita, onde os EUA têm usado um gigantesco armamento e apoio político para reforçarem um estado religioso reaccionário que chega a proibir às mulheres até o direito a conduzir! E, apesar de quietos hoje, veja-se a forma como os EUA financiaram e deram apoio militar a Osama bin Laden e a outras forças como ele no Afeganistão nos anos 1980, quando isso servia os seus interesses.

SEGUNDO: Quem quer que tenha estado por trás disto e qualquer que seja a sua intenção, além de ter causado mortes e o sofrimento de pessoas inocentes, o acontecimento beneficiou de facto os imperialistas. Estas mortes serão agora aproveitadas para reprimir ainda mais as pessoas e para justificar quaisquer acções, ainda que injustas, levadas a cabo pelos governos em resposta a isto, bem como para diabolizar sectores inteiros da população. Os acontecimentos em Paris não podem de forma nenhuma ser vistos como justificação para mais actos de agressão ou repressão — mais bombardeamentos com drones contra civis, bem como outras formas de agressão que tirem as vidas a mais pessoas inocentes, mais repressão contra os imigrantes, mais espionagem e vigilância — tudo isto ou parte disto irá muito provavelmente ser montado “como resposta”.

TERCEIRO: O próprio sistema imperialista é a causa de um gigantesco sofrimento no mundo e é, em última análise, responsável pela criação das condições que originam actos cruéis e muito erroneamente direccionados de oposição a isso. Isto pode ser visto passando um dia a estudar a história de França e as literalmente dezenas de milhões de pessoas não só impiedosamente exploradas e torturadas, mas também assassinadas no Norte de África, na África Ocidental, Caribe, Sudeste Asiático, Médio Oriente e outros lados — ao longo da história e até hoje. E o mesmo se pode dizer dos EUA, Grã-Bretanha e outras potências imperialistas. Mas coisas como o ataque de Paris não SÃO definitivamente do interesse das massas populares do mundo inteiro, e não podem ser justificadas de forma nenhuma.

QUARTO: O que é urgentemente necessário neste momento — em oposição a este tipo de actos nefastos — é, em países como os EUA (e a França) e no mundo inteiro, a criação de uma enorme resistência política e oposição ao que os imperialistas, liderados pelos imperialistas norte-americanos, estão a fazer — os muitos crimes que eles cometeram e continuam a cometer — e à forma como eles se irão aproveitar deste incidente para tentarem justificar e levar a cabo mais crimes destes. Isto deve incluir a resistência às medidas repressivas dirigidas contra as comunidades imigrantes e a oposição à diabolização dos imigrantes — medidas e diabolização que já estavam a ganhar terreno muito antes deste incidente.

FINALMENTE: Uma revolução genuinamente emancipadora — uma revolução comunista — envolve milhões e milhões de pessoas determinadas a provocar uma mudança radical da sociedade e do mundo. Essa revolução comunista visa acabar com os grotescos e horrendos sistemas e relações no mundo que causam esse incalculável e desnecessário sofrimento a literalmente milhares de milhões de pessoas em todo o globo, e os quais eles próprios também criam e são, no fim de contas, responsáveis pelas grotescas formas de oposição a isso. A natureza e os objectivos desta luta revolucionária não são nada menos que a luta consciente e determinada de milhões de pessoas e, em última análise, milhares de milhões, em todo o globo, para fazer nascer todo um novo mundo sem exploração, opressão e desigualdades sociais.

Tal como foi salientado em “Some Crucial Points of Revolutionary Orientation — in Opposition to Infantile Posturing and Distortions of Revolution” / “Puntos esenciales de orientación revolucionaria: En oposición a los alardes y las tergiversaciones infantiles de la revolución”:

Num país como os EUA, o derrube revolucionário do sistema só pode ser alcançado quando houver uma mudança importante e qualitativa na natureza da situação objectiva, de tal forma que a sociedade como um todo esteja afectada por uma crise profunda, devida fundamentalmente à natureza e ao funcionamento do próprio sistema, e juntamente com isso haja o aparecimento de um grupo de revolucionários, contando-se em milhões e milhões, consciente da necessidade da mudança revolucionária e decidido a lutar por ela. Nesta luta pela mudança revolucionária, os revolucionários e aqueles que os lideram irão ser confrontados com a violenta força repressiva da máquina do estado que encarna e impõe o actual sistema de exploração e opressão; e para que a luta revolucionária tenha êxito, precisará de enfrentar e derrotar essa violenta força repressiva da velha ordem exploradora e opressora.

Em suma, a revolução — uma mudança verdadeiramente fundamental, que verdadeiramente extirpe a opressão — é uma coisa séria e deve ser abordada de uma forma séria — sobriamente, com ciência, comprometimento e maturidade.

(Ver também os artigos abaixo)

 

“Grandes paladinos da liberdade de expressão?”

12 de Janeiro de 2015
(Fonte: revcom.us/a/369/great-champions-of-freedom-of-expression-en.html em inglês e revcom.us/a/369/los-grandes-paladines-de-la-libertad-de-expresion-es.html em castelhano)

Ao condenarem o assassinato dos jornalistas do Charlie Hebdo em França, os governantes norte-americanos estão a apresentar-se como grandes paladinos da liberdade de comunicação e expressão. Mas qual é a realidade?

» Assassinato, espionagem e golpes sujos policiais nos anos 1960. Durante os anos 1960, revolucionários como o Pantera Negra Fred Hampton e o autor e prisioneiro George Jackson foram assassinados pela polícia por terem denunciado os crimes do sistema e advogarem a revolução. O governo norte-americano empenhou-se numa gigantesca espionagem contra a luta de libertação dos afro-americanos, o movimento contra a guerra e os artistas progressistas, bem como em tentativas secretas, ao abrigo do COINTELPRO [Programa de Contra-Inteligência] do FBI, para os destruir, desacreditar e reprimir.

» Assassinato, ataques e encarceramento de apoiantes do PCR, EUA. A 22 de Abril de 1980, Damián García foi assassinado quando estava a preparar o 1º de Maio de 1980 num bairro social de Los Angeles, enquanto um agente policial se mantinha passivo por perto. O assassino de Damián declarou: “Você odeia o governo, eu sou o governo, a sua bandeira é vermelha, a minha é vermelha, branca e azul”.

Houve tentativas de incriminar o Presidente do PCR, Bob Avakian, e de o mandar para a prisão durante décadas devido a um discurso numa manifestação. Tem havido prisões, espancamentos pela polícia e frequentemente o encarceramento de centenas de apoiantes do PCR devido essencialmente a actos de liberdade de expressão.

» Espionagem de centenas de milhões de pessoas, criminalizando a expressão online. Hoje em dia, os EUA levam a cabo uma vigilância encoberta de dezenas, e provavelmente centenas, de milhões de comunicações telefónicas e pela internet — neste país e em todo o mundo. E está a criminalizar o discurso político de oposição online, incluindo nas redes sociais. Na Grã-Bretanha, cerca de 20 mil pessoas foram investigadas por comentários online. Glenn Greenwald relatou que em 2012 um jovem britânico foi encarcerado por condenar os soldados britânicos no Afeganistão (The Intercept, 6 de Janeiro de 2015) e que em Dezembro de 2014 a polícia do Massachusetts “emitiu uma convocação criminal a Charles DiRosa, de 27 anos, por ter colocado uma ‘mensagem anti-polícia no Facebook’”.

A 4 de Junho de 2014, centenas de polícias de Nova Iorque desencadearam uma rusga ao estilo militar em dois bairros sociais do Harlem e prenderam 40 pessoas por alegada “conspiração” em grupo. O pretenso processo judicial dos bófias era baseado em dezenas de milhares de gravações de chamadas telefónicas originadas em prisões, em centenas de horas de videovigilância e na espionagem policial de mais de um milhão de páginas nas redes sociais. (Ver “NYPD Terrorizes Harlem Neighborhood—Seizes Dozens of Youth” / “DPNY aterroriza un vecindario en Harlem — detiene a docenas de jóvenes”.)

» Encarceramento e perseguição de pessoas que denunciam e dizem a verdade. Quando jornalistas, agentes governamentais ou pessoal militar e outros tentam denunciar os crimes que são cometidos pelos EUA, são impiedosamente perseguidos, acusados e encarcerados. A única pessoa encarcerada devido ao programa norte-americano de tortura ilegal e imoral foi um ex-agente da CIA que o tentou denunciar — John Kiriakou. Chelsea Manning foi detida em condições que correspondem a tortura e condenada a 35 anos de prisão por ter divulgado documentos que expõem os crimes norte-americanos de guerra, mentiras e outras maquinações no Iraque, no Afeganistão e em todo o mundo. O ex-contratado da NSA Edward Snowden foi forçado a fugir dos EUA para denunciar a verdade sobre os gigantescos programas de espionagem dos EUA.

» Apoiar regimes torturadores e de estado policial em todo o mundo. Uma lista de aliados dos EUA lê-se como um “quem é quem” de juntas militares e regimes torturadores onde dissidentes e radicais são detidos sem julgamento e torturados. Um deles é a Arábia Saudita, um aliado-chave onde a penalização legal para os jornalistas que “insultam o Islão” é o chichoteamento e onde rotineiramente há decapitações.

 

O luto selectivo dos imperialistas ocidentais em relação às atrocidades

12 de Janeiro de 2015
(Fonte: revcom.us/a/369/the-imperialist-wests-selective-mourning-of-atrocities-en.html em inglês e revcom.us/a/369/el-luto-selectivo-del-occidente-imperialista-por-las-atrocidades-es.html em castelhano)

Na quarta-feira, 7 de Janeiro, o dia em que ocorreu o ataque assassino ao Charlie Hebdo, também ocorreram ou foram reveladas as seguintes atrocidades. Elas receberam muito pouca, se alguma, cobertura da comunicação social imperialista ocidental.

» Foram encontrados 10 corpos e 11 cabeças cortadas em valas comuns secretas no Estado de Guerrero, no sul do México. Segundo o ABC News (7 de Janeiro), “A maioria dos corpos tinha as mãos amarradas e mostrava sinais de tortura”. Guerrero é o estado mexicano onde 43 estudantes da escola de treino de professores rurais de Ayotzinapa foram “desaparecidos” pela polícia mexicana e por cartéis de droga em Setembro de 2014. Isto faz parte de um padrão do que a Human Rights Watch [Observatório dos Direitos Humanos] chama de “tortura generalizada” e de extensas “execuções extrajudiciais pelas forças de segurança” sob o actual governo do México.

Os governantes do México são secundados e apoiados pelos EUA. “O governo norte-americano continua a ajudar, a armar e a coordenar com o governo mexicano depois de cerca de 100 mil pessoas terem sido massacradas desde que o anterior presidente desencadeou uma ‘guerra às drogas’ em 2007”. (Ver “México: Crise política governamental persiste”)

» 577 pessoas foram mortas ou encontradas mortas no Iraque, entre as quais 150 num ataque aéreo norte-americano. Segundo o website antiwar.com, a 7 de Janeiro foi descoberta uma vala comum com 320 corpos e foram mortas pelo menos outras 200 pessoas em combates generalizados em todo o Iraque entre os EUA e o governo reaccionário iraquiano que eles apoiam, e as forças fundamentalistas islâmicas reaccionárias. O Iraq News noticiou que num ataque aéreo norte-americano a forças do ISIS [Daesh], terão sido mortas 150 pessoas. A Reuters noticiou que, até 7 de Janeiro, as forças lideradas pelos EUA tinham levado a cabo 1676 ataques aéreos contra os militantes do Estado Islâmico no Iraque e na Síria, desde 8 de Agosto, usando 4775 bombas, mísseis e outras munições. Nesse dia, o Almirante John Kirby, porta-voz do Pentágono, disse que os EUA não contabilizam o número de pessoas que matam: “Não vamos entrar numa questão de contagem de cadáveres”. Em 2014, o número de mortes de civis iraquianos duplicou em comparação com 2013, para 15 538. Toda esta carnificina é um produto directo da invasão e ocupação norte-americana do Iraque de 2003–2011. (Ver também o website Democracy Now!, 8 de Janeiro de 2015)

» Pelo menos nove pessoas, incluindo duas crianças, mortas no Afeganistão. As crianças foram mortas em Zhari, na província meridional de Kandahar, quando estavam à procura de lenha, provavelmente por uma mina ou bomba à beira da estrada. Em Shahwali Kot, Kandahar, outras 10 crianças ficaram feridas pela explosão de uma bomba, tendo sete ficado em estado crítico. No ano de 2014 houve 10 mil pessoas — um número record — mortas na actual guerra e ocupação norte-americana do Afeganistão.

“‘As nossas crianças estavam lá a recolher lenha para queimar quando foram atingidas por essa bomba’, disse Bismallah Jan, pai de uma das crianças feridas. ‘O governo deveria ter limpo a zona, é dever deles proteger-nos’”, noticiou a ABC News. “O Afeganistão é um dos países mais intensamente minados do mundo e as crianças são frequentemente mortas ou feridas quando estão a brincar, a recolher lenha ou a cuidar de animais”.

» Ventos gelados e neves põem em risco milhões de refugiados sírios na Síria, Líbano e Jordânia. “Uma violenta tempestade de inverno libertou uma torrente de chuvas e neves em algumas partes do Médio Oriente esta semana, aumentando a miséria de milhões de sírios deslocados pela guerra civil do seu país e deixando as organizações que tentam ajudá-los em dificuldades para continuarem. Ventos gélidos, desencadeando chuvas e camadas de neve, atingiram os acampamentos em países vizinhos da Síria, inundando os alojamentos, derrubando tendas e deixando os refugiados a tiritar ao frio e aumentando a probabilidade de doenças. [...] Foram encontrados três sírios, entre os quais uma criança, mortos no sul do Líbano depois de terem sido apanhados por uma tempestade”, noticiou a 7 de Janeiro o jornal The New York Times. O enorme sofrimento causado pelo que a comunicação social chama a guerra civil da Síria é o produto de um confronto tóxico entre potências imperialistas globais, em especial os EUA, potências regionais opressoras, entre as quais o regime de Assad na Síria, e forças fundamentalistas islâmicas reaccionárias.

» Em todo o mundo, cerca de 17 mil crianças com menos de cinco anos morreram a 7 de Janeiro, tal como acontece em média em cada dia do ano. Segundo a UNICEF, estas mortes são devidas esmagadoramente a causas evitáveis como a fome, a falta de higiene e água potável, e a doenças curáveis. Estas mortes — em média, 11 a cada minuto — são, em primeiro lugar, um produto dos mecanismos e do legado do capitalismo-imperialismo global.

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