A propósito da morte de Fidel Castro, republicamos um artigo originalmente publicado há 10 anos no jornal Revolution/Revolución. Este artigo, distribuído pelo Serviço Noticioso Um Mundo a Ganhar, surgiu numa altura em que o estado de saúde de Fidel Castro se tinha deteriorado e o imperialismo norte-americano salivava na antecipação de uma “mudança de regime”. A situação sofreu entretanto algumas alterações e sobre isso ver o artigo Castro e Obama: Um pungente aperto de mão. Ver também O bombista favorito de George Bush.

Do Serviço Noticioso Um Mundo A Ganhar (SNUMAG) de 7 de agosto de 2006, aworldtowinns.co.uk

O seguinte artigo de Raymond Lotta é reproduzido da edição datada de 13 de agosto de 2006 do Revolution/Revolución, jornal do Partido Comunista Revolucionário, EUA (revcom.us).

A vigília à morte de Castro:
As manobras dos EUA e as mentiras anticomunistas

Por Raymond Lotta

O líder cubano Fidel Castro foi submetido a uma cirurgia intestinal de emergência. A comunicação social dos EUA foi quase vertiginosa a relatar “vigílias de morte” sobre a possível saída de cena de Castro. A administração Bush está a lamber as suas feridas com uma potencial crise de liderança em Cuba. Há cálculos a sangue-frio sobre aberturas e pretextos para interferência e intervenção dos EUA de modo a provocar uma “mudança de regime” em Cuba. Aos elementos mais reaccionários da comunidade cubano-americana foi dada voz para apelarem ao retorno à “velha Cuba”.

O presidente Bush declarou que os EUA apoiariam os que trabalham para “construir um governo de transição em Cuba empenhado na democracia”. As pessoas devem questionar-se: será que o povo cubano realmente quer a democracia que os EUA levaram ao Iraque e ao mundo?

O afastamento de Fidel Castro do poder tem sido um dos objectivos da política externa dos EUA desde a revolução cubana de 1959. Porquê? Fidel Castro liderou uma luta anti-imperialista de massas que disse aos EUA: Cuba não vos pertence! O governo de Castro nacionalizou as empresas e os bens norte-americanos. Deu aos oprimidos de toda a América Latina a esperança de que também poderiam expulsar os exploradores ianques. Para o imperialismo norte-americano, isso era imperdoável. Durante décadas, os EUA trabalharam para destruir esse regime: invadindo e bloqueando, infiltrando espiões e sabotadores e fazendo atentados directos à vida de Castro.

O facto de Cuba não ser genuinamente socialista e Castro não ser um verdadeiro comunista quase não diminuiu o ódio do imperialismo norte-americano a esse regime. Castro recusou-se a ceder perante as exigências e os pedidos dos EUA de devolver Cuba às forças e interesses patrocinados pelos EUA. Ele manteve-se um crítico vocal da política externa dos EUA. Apoiou várias forças anti-norte-americanas na América Latina. Com os EUA a desencadearem a sua “guerra a nível mundial” e a exigir a todos que “ou estão connosco ou contra nós”, a obstinação de Castro era ainda mais inaceitável para os governantes dos EUA.

Em 2003, a administração Bush reuniu uma Comissão Multi-Agências de Apoio a uma Cuba Livre, presidida pela Secretária de Estado Condoleezza Rice. Em 2004, a Comissão emitiu o seu primeiro relatório esboçando os passos que os EUA tomariam para provocar uma mudança de regime. Esses passos incluíam a subversão dos planos de Castro para entregar os seus poderes ao seu irmão mais novo Raul. Um relatório de seguimento divulgado o mês passado recomendava um fundo de 80 milhões de dólares para apoiar a oposição de Cuba e o desenvolvimento da ajuda dos EUA assim que um “governo de transição” tomasse o poder. No ano passado, Rice anunciou a criação de um novo lugar para ajudar a “acelerar a transferência” do governo de Castro.

Agora que Castro está hospitalizado, a equipa de Bush está a fazer um barulho ainda maior e ameaças mais arrojadas ao regime cubano. A sua conjectura é a de que Cuba é um fruto maduro para a recolha imperial. Um porta-voz do Departamento de Estado declarou: “os Estados Unidos tomarão um papel activo na definição dos acontecimentos na ilha se o líder cubano morrer”. Pouco antes de Bush ir de férias no início de Agosto, ele avisou que os EUA iriam “tomar nota dos que, no actual regime cubano, obstruem os desejos [dos cubanos] de uma Cuba livre”. Por outras palavras, os EUA estão a afirmar o direito a inserirem-se numa “Cuba pós-Castro” e mesmo a desenhar uma linha na areia: não haverá lugar para os restos do regime de Castro. Essa é uma das maiores razões por que os reaccionários cubanos estão a ser preparados em Miami. Estão a contar com eles como servos leais que imporão os planos dos EUA para a “Cuba depois de Castro”.

Há importantes considerações geoestratégicas ligadas às manobras dos EUA para uma Cuba “pós-Castro”. Ao levarem a cabo a sua “guerra a nível mundial”, os imperialistas norte-americanos não prestaram tanta atenção à América Latina como ao Médio Oriente e à Ásia Central. O governo de Hugo Chávez na Venezuela tem exercitado o seu músculo dos rendimentos do petróleo e aliou-se a Castro. Se os EUA puderem abater uma Cuba debilitada e reintegrá-la na sua cadeia imperial, isto enviará uma mensagem a Chávez e aos outros governos que mantém posições mais independentes dos EUA.

Os EUA também estão a usar a actual situação para propagar mentiras sobre o comunismo – de que o comunismo é o “controlo totalitário” sobre as pessoas. Esta caricatura não tem nada a ver com o verdadeiro comunismo, o qual significa o proletariado tomar a sociedade e transformá-la conscientemente para abolir todas as classes e distinções de classe e emancipar toda a humanidade.

A comunicação social dos EUA encoraja os exilados cubanos reaccionários a falar sobre os “horrores” do comunismo e de como eles sofreram pessoalmente. Mas quem são essas pessoas e o que é que defendem? Muitas faziam parte das famílias que beneficiavam do controlo e dos privilégios das multinacionais norte-americanas na Cuba pré-1959. E querem transformar Cuba uma vez mais numa neocolónia dos EUA – o que significará “horrores” para as massas cubanas.

Cuba não é socialista mas tem certas características formais que a fazem parecer ser socialista: empresas do estado e extensos programas sociais financiados pelo estado. A administração Bush, com base na doutrina anticomunista, fala com entusiasmo da “privatização” da economia de Cuba. Para quem, para a elite de Miami que quer as suas propriedades e o seu poder... para as multinacionais norte-americanas que procuram mão-de-obra barata? Um editorial do New York Times defendia uma “sociedade economicamente dinâmica” em Cuba. Bem, olhemos para as maravilhas do capitalismo sem limites na América Latina. Nos anos 90, a desregulação e a privatização foram amplamente impostas nesses países pelos EUA e pelo Fundo Monetário Internacional. O resultado foi uma “década perdida” de desenvolvimento e um enorme aumento da pobreza e da desigualdade. E Cuba, embora de facto não seja socialista, tem uma taxa de mortalidade infantil mais baixa que Washington, D.C. – e é um país do Terceiro Mundo.

Os EUA não têm direito nenhum a intrometer-se nos assuntos de Cuba. Não têm direito nenhum a ditar o futuro de Cuba. Os planos dos EUA para Cuba devem ser denunciados e combatidos pelo que eles representam: brutais manobras do império.

(Para um pequeno texto de fundo que explica porque é que Cuba não é socialista e o que são os verdadeiros socialismo e comunismo, leia o artigo de Lotta “U.S. Imperialism, the Cuban Revolution, and Fidel Castro” [“O Imperialismo Norte-americano, a Revolução Cubana e Fidel Castro”] no jornal Revolution/Revolución nº 56 em revcom.us. Leia também as Notes on the Political Economy of Cuba [Notas sobre a Economia Política de Cuba] nos n.os 14 e 15 (1989-90) da revista A World to Win [Um Mundo a Ganhar], disponíveis em inglês em http://bannedthought.net/International/RIM/AWTW/1989-14/AWTW-14-Cuba.pdf e http://bannedthought.net/International/RIM/AWTW/1990-15/AWTW-1990-15-Cuba.pdf.

Principais Tópicos