Do Serviço Noticioso Um Mundo A Ganhar (SNUMAG) de 21 de Setembro de 2009, aworldtowinns.co.uk
Apesar do terror, o povo iraniano recusa-se a recuar
A 18 de Setembro, os iranianos encheram uma vez mais as ruas para exprimirem o seu ódio ao regime. Este tem reprimido brutalmente qualquer tipo de oposição nas últimas seis semanas e não autorizou nenhuma manifestação nos últimos três meses, mas desta vez viu-se perante uma contradição que fez com que não pudesse negar ao povo esta oportunidade de protestar.
Desde pouco depois da revolução de há 30 anos atrás, esse dia tem sido chamado de Dia Quds (da Palestina). O regime mobiliza todos os anos milhares de pessoas para se manifestarem. Isso é supostamente em defesa da Palestina, mas é na realidade uma tentativa de promover a islamização da Palestina e de fortalecer a sua própria corrente religiosa e organizações locais. Por isso, o regime não podia impedir as pessoas de se manifestarem nesse dia. Mas isso não impediu o Líder Supremo Aiatola Ali Khamenei e os seus principais comandantes militares e forças de segurança de ameaçaram as pessoas com a mais severa das vinganças se elas aproveitassem a ocasião para exprimirem qualquer oposição. Eles avisaram que as palavras de ordem “erradas” seriam castigadas. Ao mesmo tempo, como sabiam que de qualquer forma muita gente sairia à rua para protestar, eles fizeram o seu melhor para mobilizarem os seus próprios apoiantes. Chegaram mesmo a pagar as despesas e algo mais para que pessoas de aldeias e cidades distantes fossem levadas a reuniões pró-regime em Teerão e noutras grandes cidades.
Mas o dia acabou por ser um fracasso político para o regime. Há relatos contraditórios no exterior do país sobre o número de manifestantes antigovernamentais em Teerão, mas de qualquer forma parece que os manifestantes “roubaram o dia” num número muito maior que o esperado, dadas as circunstâncias de extrema repressão. A sua “ousadia aturdiu alguns observadores... ‘Nós impusemo-nos e alterámos a agenda do dia’”, disse um estudante ao repórter do jornal LA Times (19 de Setembro).
Por vezes ignorando os manifestantes pró-governamentais e muitas vezes abafando-os com os seus gritos, eles ocuparam a grande Praça Sétimo de Tir. Cada vez mais incentivados com essa vitória, enfrentaram as forças de segurança enquanto tentavam sem êxito marchar rumo à Praça Enghelab, onde se concentravam as forças pró-governamentais.
Também houve protestos contra o regime noutras cidades e vilas, entre as quais Tabriz, Shiraz, Isfahan, Mashhad, Ahvaz e Uroumeih.
Nos protestos anteriores, os principais participantes eram jovens, rapazes e raparigas. Devido à tortura, à violação e ao assassinato de alguns dos presos, o regime esperava que os pais não deixassem os seus filhos voltarem a sair às ruas. Mas, pelo contrário, desta vez os pais e, em alguns casos, os avós juntaram-se aos protestos. Gente de todos os estratos sociais saiu à rua para denunciar o regime e as suas autoridades. Gritaram: “A violação e a tortura já não nos assustam”, “Abaixo o ditador” e “Violação, crime, morte à Velayat-e Faqi” (o “regime do jurisprudente”, ou seja, tanto o cargo como a pessoa de Khamenei).
Uma outra característica deste protesto foi que o Movimento Verde estava mais organizado que em qualquer outra ocasião anterior. (Este movimento está associado à facção reformista do regime, encabeçada pelos candidatos presidenciais Mir-Hossein Mousavi e Mehdi Karoubi, e a Mohammad Khatami, presidente entre 1997 e 2005.) Os Verdes representaram um importante papel nos primeiros protestos após as eleições de Junho, mas o seu controlo dos protestos foi-se reduzindo gradualmente à medida que as acções de rua foram sendo mais radicalizadas pela juventude rebelde. Porém, desta vez, a sua presença foi de novo mais visível, assinalada por bandeiras e t-shirts verdes e por algumas das palavras de ordem. Especificamente, havia mais palavras de ordem em defesa de Mousavi e Karoubi e os organizadores levaram as pessoas a gritar “Allah-u Akbar” (“Deus é grande”) e outras expressões de índole religiosa.
Propagaram-se algumas palavras de ordem políticas perigosas e erradas como “Não Gaza, não o Líbano, eu dou a minha vida pelo Irão”, que fortalecem o chauvinismo iraniano e persa e rejeitam claramente o internacionalismo, o qual é uma parte necessária de qualquer movimento que sirva os interesses mais fundamentais do povo. Essas palavras de ordem foram gritadas em Teerão e noutras cidades. Esse tipo de sentimentos também foi apoiado no estrangeiro por proeminentes iranianos de direita que são próximos dos EUA. Que as pessoas estejam dispostas a repetir essas palavras de ordem mostra a sua frustração com as cansativas e enfadonhas palavras de ordem do sector fundamentalista do regime em defesa do Hezbollah do Líbano e do Hamas da Palestina. Esta reacção errada também foi fortalecida por persistentes boatos de que o regime tem usado os milicianos do Hezbollah do Líbano para atacar as manifestações. De uma forma semelhante, quando os altifalantes do regime gritavam “Abaixo os EUA”, muita gente na multidão respondia “Abaixo a Rússia e a China”, países que Ahmadinejad diz apoiarem o seu regime. Isto mostrava como as pessoas estavam a reagir espontaneamente contra tudo o que vêem como sendo favorável ao seu inimigo.
Mas nada disto – nem mesmo que os boatos fossem verdadeiros – pode justificar essas palavras de ordem erradas e chauvinistas, cujo efeito é dividir povos que partilham a mesma causa justa e opô-los uns aos outros. O movimento popular fortalecer-se-á se assumir uma linha internacionalista, se apoiar outros povos oprimidos e se obtiver o seu apoio e se, ao mesmo tempo, combater tendências reaccionárias como as do Hezbollah e do Hamas que estão a tentar levar o povo para o mesmo tipo de inferno que o estabelecido pela República Islâmica do Irão.
Não há dúvida nenhuma que as massas populares têm uma causa justa e que há elementos reaccionários que estão novamente a tentar roubar o movimento popular. É por isso que a existência de uma liderança revolucionária é de uma importância tão vital.
Por outro lado, também houve bastantes palavras de ordem correctas em diferentes locais, tais como “O Irão tornou-se numa Palestina, porque é que toleramos isso pacificamente?”, “Liberdade para todos os presos políticos”, “O sangue que corre nas nossas veias é um dádiva ao nosso povo”, “Palestina! Estamos na mesma situação que vós” e “Morte ao ditador”.
Membros da milícia pró-regime Basij foram organizados para atacar fisicamente líderes reformistas como Khatami e Mousavi. Houve confrontos entre manifestantes e os basiji e outras forças à paisana. Em alguns casos, os basiji foram obrigados a abandonar as suas motos e fugir. As ruas encheram-se de veículos de duas rodas queimados que os manifestantes tinham incendiado. Também foram presas algumas pessoas. Embora o regime tenha confirmado a prisão de 35 manifestantes, algumas fontes dizem que o número de pessoas presas pode chegar a 400.
Globalmente, a participação de um grande número de manifestantes marcou o regresso das pessoas às ruas. Este protesto enviou uma clara mensagem aos governantes de que o povo não recuou apesar do reinado de terror desencadeado pelos arruaceiros basiji e pelos chamados Guardas Revolucionários do regime e das violações, tortura e assassinato de manifestantes. Um dos últimos e mais fortes pilares do regime – a repressão – perdeu muita da sua eficácia. Isso pode vir a gerar mais medo, desmoralização, lutas internas e crise dentro do próprio regime.
Isto são boas notícias para o povo. Porém, o regime não permanecerá inactivo e sem fazer nada. Ainda não usou todos os seus trunfos, entre os quais um pedido de apoio internacional. As cimeiras internacionais sobre o Irão agendadas para os próximos dois meses darão algum indício das relações que se estão a desenvolver entre a República Islâmica do Irão e os imperialistas e outras grandes potências.
Globalmente, pode-se dizer que há oportunidades e perigos para o povo. O que irá acontecer ao movimento, irá depender em grande parte de as forças revolucionárias e comunistas conseguirem chegar-se à frente e liderá-lo ou pelo menos aumentarem a sua influência. Caso contrário, as classes reaccionárias continuarão uma vez mais a enganar o povo e a dissipar o seu movimento.