Do Serviço Noticioso Um Mundo A Ganhar (SNUMAG) de 23 de Novembro de 2009, aworldtowinns.co.uk
Cleveland, EUA: Ele assassinou mulheres durante anos porque quem está no poder não se preocupou
Um assassino em série andou a estrangular mulheres num bairro negro pobre da cidade norte-americana de Cleveland. A polícia acabou por fazer buscas à casa de Anthony Sowell em Setembro, depois de ele ter tentado sem êxito sequestrar uma outra mulher do bairro. Encontraram os restos mortais de pelo menos 11 mulheres. Mas muito mais para além dos horrendos crimes de um só homem começou a vir a lume. Veio a verificar-se que as autoridades tinham motivos para saber o que estava a acontecer e não se preocuparam.
Por exemplo, uma jovem ferida fez parar uma patrulha policial numa rua próxima da casa de Sowell em Dezembro de 2008. Ela disse aos agentes que Sowell a tinha agarrado quando passava perto da casa dele, que a tinha arrastado para trás do edifício e a tinha espancado e tentado violar. A polícia encontrou sangue no chão e na cara dele quando foram prender Sowell. Apesar disso, os registos policiais indicam que eles acharam que a mulher não era “credível”, que as acusações dela eram “infundadas” (apesar de Sowell ter estado 15 anos na prisão por violação) e que, no máximo, isso teria sido uma tentativa menor de roubo. Acabaram por o libertar sem qualquer acusação (The Washington Post, 13 de Novembro de 2009). Não deram qualquer atenção aos vizinhos que suspeitavam que algo muito mau estava a ocorrer naquela casa, nem se preocuparam com o facto de frequentemente o local cheirar a carne em decomposição.
As autoridades dizem agora que a maioria das mulheres cujos corpos foram encontrados vivia sozinha ou nas ruas e tinham problemas de droga ou álcool. Isto até pode ser verdade, mas o problema não é que as autoridades não tinham nenhuma forma de saber o que lhes faltava. Depois do caso ter chegado à comunicação social, outras mulheres vieram dizer que Sowell também as tinha tentado matar, mas que não tinham ido à polícia porque sabiam que seriam tratadas como criminosas, não como vítimas. Sowell estava protegido pelo facto de que quem tem o poder não se preocupa com o que acontece aos mais oprimidos nem em geral com a violação – segundo o The Washington Post, possivelmente quase 80 por cento das mulheres que são violadas nos EUA nunca o ousa reportar. Agora, os responsáveis locais, os padres e outras autoridades estão a apelar às pessoas do bairro que “ultrapassassem” o incidente e ponham esse passado doloroso para trás.
O texto que se segue é um artigo extraído do n.º 184, de 29 de Novembro de 2009, do Revolution/Revolución, voz do Partido Comunista Revolucionário, EUA (revcom.us/a/184/Cleveland_murders-en.html em inglês e revcom.us/a/184/Cleveland_murders-es.html em castelhano).
Durante anos, as pessoas sentiam algo de errado e faziam perguntas: sobre o penetrante cheiro a podre, sobre as drogas na zona, sobre as mulheres desaparecidas uma após outra. E agora que emergiu a repugnante realidade, o que ouvimos dos responsáveis resume-se basicamente a isto: “Fizemos tudo o que pudemos. Vamos unir-nos e avançar. Agradeçamos ao senhor e abençoemos os mortos e deixemos o caso às autoridades; afinal de contas, essas mulheres eram viciadas em drogas, alcoólicas, provavelmente prostitutas. (...) É uma tragédia, claro, mas temos de ultrapassar isto e deixar isto em paz.”
Semanas depois das primeiras notícias terem surgido, as pessoas não estão a deixar isto em paz. Na esquina das Ruas 123 e Imperial, onde a casa de Anthony Sowell, o local da morte, continua cercado por fitas amarelas da polícia, passa um fluxo ininterrupto de pessoas, a pé, de bicicleta, a conduzirem lentamente os seus carros. Familiares, conhecidos, vizinhos, jovens – muitas pessoas que conheciam uma ou muitas das mulheres, vinham buscar força umas às outras e tentar compreender o significado deste pesadelo.
Uma religiosa negra está parada na rua. Com ela está uma rapariga. Essa mulher não é uma das defensoras da paz. “Nenhuma mulher merece sofrer este tipo de coisa, independentemente do seu estilo de vida ou dos seus erros, elas não mereciam que as suas vidas fossem ceifadas. Pura e simplesmente não o mereciam. Aparentemente, os polícias ignoraram isto porque se veio a saber que houve mais de uma chamada.”
Ela continua: “As poucas mulheres que sobreviveram, que de facto escaparam, tiveram vergonha de falar por causa do seu passado e isso nunca não deveria ter sido um impedimento. Se essas mulheres não tivessem tido medo de dizer alguma coisa devido ao seu passado porque, na realidade, a primeira coisa que se ouve dizer é ‘oh, ela é uma viciada’, ou outra coisa parecida, então isso é como dizer, bem, ‘eu não estou a levar-te a sério’. Mas independentemente de quanto alguém escolha valorizar a sua própria vida, todas as vidas são valiosas. (...) Eles fizeram isso a todas as mulheres, todas as mulheres foram desrespeitadas. Eu vou continuar a fazer barulho – Até me vêm lágrimas aos olhos porque é simplesmente horrível. Eu não tenho conseguido dormir.”
“Toda a gente na cidade, no estado, devia estar aqui, todas as mulheres, toda a gente devia estar aqui. Nós vamos fazer isto todo o fim-de-semana, para propagar a mensagem da causa de todas as mulheres. Elas podiam ter desenvolvido uma deusa dentro delas, mas nunca tiveram qualquer hipótese. É uma injustiça. Nós precisamos de ficar juntas, de trabalhar em conjunto.”
Do outro lado da rua, familiares e amigos ergueram um muro onde colocaram fotos e pelo menos 15 nomes de mulheres desaparecidas e assassinadas, onde se escrevem comentários, onde se empilham ursos de peluche e flores. É um memorial com um objectivo urgente. As pessoas, por vezes completos estranhos, partilham memórias e pensamentos e observam de perto as fotografias e artigos de jornais para verem quem poderão conhecer, que corpos foram identificados e quem ainda está desaparecido. Algumas das mulheres estão desaparecidas há anos. Algumas eram do outro lado da cidade. Pouco importa. As pessoas querem conhecer toda a história.
Entre os comentários de “Amamos-te” e “Deus te Abençoe”, no muro está algo diferente, foi colocada uma citação do Revolution/Revolución n.º 158, a “Declaração: Pela Libertação da Mulher e a Emancipação de Toda a Humanidade” (revcom.us/a/158/Declaration-en.html em inglês e revcom.us/a/158/Declaration-es.html em castelhano):
As mulheres não são máquinas de procriação. As mulheres não são seres inferiores. As mulheres não são objectos criados para o prazer sexual dos homens. As mulheres são seres humanos capazes de participar integral e igualmente em todo o domínio da experiencia humana. Quando as mulheres são rebaixadas, toda a humanidade é vergada. As mulheres têm que conquistar a sua libertação e elas só podem ser libertadas através da transformação revolucionária do mundo e da emancipação de toda a humanidade e sendo uma poderosa força motivadora dessa revolução. (...)
Quando tão poucos o irão ousar fazer, esta declaração apela a algo já não visto há muitas gerações: uma intransigente efusão de mulheres e homens de todo o mundo que se recusam a ver as mulheres ser oprimidas, espancadas, encarceradas, insultadas, violadas, abusadas, assediadas, exploradas, assassinadas, escarradas, atingidas com ácido, abusadas, humilhadas e sistematicamente diminuídas.
Cópias desta citação estão a ser lidas palavra a palavra por olhos chorosos durante toda a noite por um grande número de pessoas; cópias estão a ser dobradas e metidas nos bolsos, a que se seguem conversas e uma vista de olhos às edições do Revolution/Revolución. Isto ajudou a focar a ira e a agonia popular na busca da compreensão e de soluções.
À medida que os carros passam, que as pessoas se chamam umas às outras, que a indignação e a mágoa se misturam, alguém buzina a um dos camaradas, que grita:
“E o que é que as autoridades nos dizem que devemos fazer? Rezar, unirmo-nos e ultrapassar – ultrapassar o quê? Ultrapassar o assassinato de mais 11 mulheres negras?? Nós não vamos ultrapassar isto. NÃO! Esquecer este ódio sádico às mulheres? NÃO! Para o sistema isto não quer dizer nada; eles disseram que não iam andar à procura de ‘cabras viciadas’. (...) Foi exactamente isso que as autoridades disseram após a descoberta do assassinato em massa, o chefe da polícia disse que eles não sabiam como é que essas mulheres viviam, ele e outros usaram essa merda racista de que essas mulheres o tinham pedido porque tinham problemas de droga, estavam na prisão e algumas delas podem mesmo ter sido prostitutas. Como têm dito alguns familiares das vítimas: ‘A minha filha pode ter tido problemas, mas ela era um bom ser humano’.”
As pessoas respondem: “Fala, isso é verdade. Fala. Não, nós não estamos a ultrapassar!!”
“As pessoas têm o coração destroçado com o que aconteceu, estão indignadas com a apatia das autoridades. Não, não estamos a ultrapassar e não o vamos fazer. Quanto a unirmo-nos, nós precisamos de aprofundar a nossa desunião com os responsáveis da cidade. Nós não nos estamos a unir aos responsáveis da cidade e não nos estamos a unir à polícia. (...) Precisamos de apontar o dedo da culpa não só às autoridades como a todas as instituições, a todo o sistema que diariamente degrada as mulheres.”
Surgem mais gritos: “Todo o sistema é culpado disto!”
É um facto: a polícia nunca pode ser parte da solução – eles estavam a “fazer o seu trabalho” quando deixaram este violador em série matar, tal como estão a “fazer o seu trabalho” quando disparam e matam jovens negros por andaram na rua. O seu trabalho é impor um mundo de opressão e injustiça. O nosso interlocutor continua:
“É toda uma indústria pornográfica de multibiliões de dólares que mostra a crueldade contra as mulheres, a degradação – isso parece estar bem para eles. É essa a ligação em que uma em cada três mulheres das forças armadas são atacadas e em que a violação e o assassinato continuam a ocorrer diariamente – 600 violações e ataques diários – é isso que está em jogo e é por isso que a revolução é a única solução. Precisamos de uma sociedade onde as mulheres tenham dignidade. Era isso que acontecia na China quando ainda era uma sociedade revolucionária, e na União Soviética. Elas tinham igualdade. Não eram os homens que protegiam as mulheres. Não era os homens a oprimir as mulheres. Apelo a que todos se juntem ao movimento revolucionário, a que venham, se inscrevam e falem comigo!”
Um sentimento colectivo teve expressão em algumas pessoas nessa esquina nesse momento: “Tu tens razão; essa é a solução!”, “Tu tens razão, temos de ter uma revolução e se não formos nós a fazê-la, nunca será feita.”
As pessoas estão agora a falar sobre a sociedade. Na rotina diária, ocorre-nos uma sensação de sofrimento e desespero isolados – uma mulher que é violada e tem demasiada vergonha de o dizer; uma família cuja filha desaparece e que tenta decidir entre ela o que fazer; crianças que andam durante dias à procura da mãe. Mas, à medida que esta tragédia e horror se desenvolvem, surge um problema maior e começa a compor-se uma consciência das ligações. Um homem manifesta a sua indignação contra as autoridades: “Eles sabem. Elas estavam desaparecidas. As pessoas a quem eles chamam ‘transientes’, essas pessoas são mães e irmãs. Não me interessa o que elas fizeram. O que eles criaram foi um animal. Quando põem um homem na prisão durante anos. (...) E ele esteve nos fuzileiros, eles criam monstros, ensinam-nos a matar e a enterrar. Eles sabem o que estão a fazer.”
Está-se a fazer um esforço esmagador para enfrentar estas terríveis realidades. A Declaração apela: imaginem um mundo livre de tudo isto. E é como um trovão, ouvir dizer que um outro mundo não é só um sonho, é possível. Ultrapassar a paralisia de dor e medo e de desespero e resignação, compreender o pleno significado dessas palavras e torna-las realidade – é como a primeira lufada de ar depois de o ar nos ter sido extraído dos nossos pulmões.
A luta e a conversa continuam; fazem-se planos. Alguns rapazes estão parados junto ao muro, recebendo silenciosamente tudo isto. Um camarada pergunta: “O que é que vocês acham que tudo isto diz sobre a forma como as mulheres são vistas nesta sociedade?”. Um deles responde: “Que elas aceitam qualquer coisa”. Sorri e dá uma cotovelada no amigo para partilhar a “piada”. Mas o amigo não entra nisso. Ele quer ver que mais está no jornal, as imagens das páginas centrais sobre a situação das mulheres. Falamos sobre a questão da prisão. Ele diz: “Não tenho dinheiro mas vou levar esse jornal e vou lê-lo”.
Uma jovem negra que tem um projecto de documentário vídeo independente partilha os seus pensamentos: “Devo dizer que é chocante porque acontece na minha própria cidade, mas tendo viajado, vamos a qualquer ponto do mundo, ouvimos falar desses gigantescos e horrendos actos violentos contra as mulheres. Como o das mulheres de Juarez, no México, que estão a morrer diariamente e ninguém o está a resolver. Há mulheres que são mortas todos os dias apenas devido a actos violentos e isso não tem justificação. Vamos de lugares onde se ergueram civilizações e religiões à volta das mulheres e onde o respeito é compreendido e integrado no tecido dessas sociedades. Mas agora vivemos num tempo em que o que interessa é como podemos destruir as mulheres e a natureza e tudo o que é belo. Por isso eu acho que é um sinal da sociedade em que vivemos; não se trata apenas de um homem, sabes, ele é o produto deste ambiente em que todos somos vítimas de nele crescermos.”
Dizemos às pessoas que venham connosco até Chicago para ouvirem Raymond Lotta, cuja digressão tem a ver com expor a verdade sobre o fracasso do capitalismo e sobre como nos contam a mentira de que o comunismo é mau, sobre a verdade das verdadeiras sociedades revolucionárias que foram enterradas. Isto assume um importante significado no contexto do que aqui está a acontecer. Alguns decidem juntar aos revolucionários na reunião que irá ter lugar nessa noite, para ajudarem a divulgar esta mensagem e para irem no dia seguinte para outra esquina para divulgarem a palavra e distribuírem o Revolution/Revolución...