Do Serviço Noticioso Um Mundo A Ganhar (SNUMAG) de 19 de janeiro de 2019, aworldtowinns.co.uk
O Egito, de Obama a Trump: crimes impiedosos contra a humanidade
O responsável pela política externa de Trump, Michael Pompeo, fez um importante discurso no Cairo, no Egito, no início de uma digressão pelos países do Golfo, pela Jordânia e pelo Iraque. Ele foi lá para anunciar — e implementar — aquilo a que chamou de “um novo começo”, supostamente alterando a orientação estabelecida por Obama uma década antes, num discurso na mesma cidade.
Tanto Obama como Pompeo alegaram, como disse Obama, que “os Estados Unidos têm sido uma das maiores fontes de progresso que o mundo já conheceu”. O que os dois homens têm em comum é que ambos mentiram escandalosamente. Os objetivos globais da política externa norte-americana não mudaram fundamentalmente e não têm nada a ver com o progresso, têm tudo a ver com dominar os povos do mundo, bem como os rivais dos EUA. O caso do Egito mostra isso, embora seja apenas um em muitos, muitos exemplos.
Mas Pompeu, como titular da política externa do regime fascista de Trump e Pence, também lá estava para fazer algumas mudanças. Os EUA têm sido “demasiado tímidos a se afirmarem”, advertiu ele. “A idade da vergonha autoinfligida norte-americana acabou”. Em contraste com Obama, cujo apoio ao homicida homem-forte egípcio al-Sisi ficou envolto em sigilo e hipocrisia, o esbirro de Trump comemorou isso descaradamente. Isso transmite um sinal claro aos sauditas e às outras monarquias árabes e regimes reacionários da região e de todo o mundo de que os EUA não os irão abandonar, não importa quantas pessoas eles assassinem. Além disso, enquanto o objetivo de Obama era manter a “estabilidade” da dominação norte-americana — a que Pompeo chamou “timidez” —, Trump está a olhar para a deterioração da dominação norte-americana da região, ao mesmo tempo que emergiram novos desafios à sua capacidade de moldar o mundo. Ele enviou Pompeo em digressão como parte do fortalecimento dos laços norte-americanos-sauditas e do alcance do poderio saudita, incluindo o seu forte e crescente controlo do Egito, o qual, por sua vez, é importante para subjugar o Iémen, que está a sofrer horrivelmente com a guerra que aí está a decorrer. O objetivo é remodelar a região, de que um ponto-chave é enfrentar o Irão, mesmo que à custa dos atuais assassinatos em massa e da perspetiva de assassinar a uma escala quase inimaginável.
O Egito da América
As forças armadas do Egito têm estado desde há muito tempo no centro da classe dominante do país, cuja riqueza e poder são dependentes da subordinação ao sistema imperialista mundial e, especialmente, aos EUA. O estado norte-americano despejou mais dinheiro no Egito que em qualquer outro país, à exceção de Israel, financiando diretamente as suas enormes forças armadas e reforçando uma economia em que os generais do Egito são os atores centrais. Isso tem permitido aos imperialistas norte-americanos usarem o Egito, de longe o mais povoado dos países árabes, juntamente com a minúscula, mas imensamente rica, monarquia da Arábia Saudita e o posto militar avançado dos EUA chamado Israel — três estados que se apoiam uns aos outros e que de certa maneira são interdependente — como pilares da dominação norte-americana de uma região que, por sua vez, tem sido chave para o seu impulso para a hegemonia mundial.
Durante décadas, esta situação esteve encarnada no regime de Hosni Mubarak, que muitos egípcios viam como responsável pelo sofrimento e frustração deles. Depois, em 2011, explodiu a “Primavera Árabe”: inspirada pela revolta na Tunísia que expulsou o regime de Ben Ali, centenas de milhares de pessoas iniciaram protestos não-violentos na Praça Tahrir, no Cairo. Mas mesmo quando o regime de Mubarak assassinou a tiro centenas de pessoas durante 18 dias de uma justa rebelião em massa, o governo de Obama continuou, cinicamente, a apoiar Mubark até ao último minuto. No final, os militares egípcios intervieram e depuseram-no, com a bênção dos EUA, a fim de evitarem que a revolta se desenvolvesse ainda mais e debilitasse o estado no seu conjunto. Ao longo das voltas e reviravoltas que se seguiram, mesmo quando os jovens e outras pessoas do Egito se voltaram contra a repressão e a teimosa defesa por parte dos militares da opressora ordem social e lutaram para que a rebelião continuasse, os EUA nunca vacilaram no seu apoio aos militares, mesmo quando os soldados e os atiradores furtivos uma vez mais abateram centenas de manifestantes — muitos dos quais, sem dúvida, davam algum crédito aos chamados “ideais democráticos” dos Estados Unidos a que Obama chamou “a esperança da humanidade”.
Nesse momento, a eleição de um governo islâmico “moderado” constituiu mais um outro desafio aos interesses mais gerais dos EUA, e então como é que os EUA garantiram a promessa de Obama de “progresso” e “democracia”? Dando luz verde quando o exército do Egito avançou uma vez mais para tomar diretamente as rédeas do poder. O massacre de mais de 800 pessoas num protesto islamita e as detenções de membros do movimento dos jovens e de outras pessoas que se opunham a um regime militar permanente não fez com que o governo de Obama mudasse o seu rumo fundamental, apesar de alguns cacarejos de desaprovação. Por fim, o general que hoje está no topo do regime do Egito, al-Sisi, foi eleito presidente, demonstrando assim o caráter dispensável das eleições nos estados do sistema imperialista.
O regime de al-Sisi tem hoje mais de 60 mil presos políticos, segundo a organização Human Rights Watch. Embora al-Sisi alegue que isso é um subproduto necessário de uma guerra contra o “terrorismo” islamita, o ressurgimento dos grupos fundamentalistas islâmicos armados reacionários foi alimentado pela repressão assassina por parte do regime dele. Os responsáveis norte-americanos, tanto sob Obama como sob Trump, sabem perfeitamente que muitos dos mortos na guerra do Egito contra esses grupos na Península do Sinai, com envolvimento militar israelita ativo, são de facto civis ou presos políticos que foram torturados até a morte noutros lugares e cujos corpos foram aí despejados. (Ver o livro do jornalista do New York Times, David Kirkpatrick, Into the Hands of Soldiers {Nas Mãos de Soldados}, p. 289)
Além disso, num país em que o Islão é a religião oficial, em que “insultar a religião” é um crime e em que a vida oficial continua a ser organizada em torno da afiliação religiosa, o próprio regime de al-Sisi promove as ideias religiosas mais nefastas, especialmente contra as mulheres. Os violadores continuam a desfrutar de uma virtual impunidade porque, dizem as autoridades, as mulheres que não se conformam aos padrões religiosos são uma ameaça fundamental à sociedade. Uma jovem mãe que publicou nas redes sociais uma crítica à tolerância do governo para com as agressões sexuais foi recentemente sentenciada a dois anos de prisão por divulgar “notícias falsas”. Acusações similares são rotineiramente aplicadas a pessoas dos meios de comunicação, a bloguistas, a artistas, a intelectuais desafiadoramente laicos e a outras pessoas. Muitas pessoas do movimento dos jovens foram condenadas a longas penas de prisão ou a prisão perpétua e estão maioritariamente mantidos em confinamento solitário.
O convite de Trump a al-Sisi para o visitar no início de 2017 representou o fim de um certo tipo de hipocrisia: porque o reinado de terror e atraso reforçado no Egito está agora mais em consonância com os próprios objetivos explícitos do regime Trump, com o que este está a tentar impor nos EUA em nome do que Pompeo chamou de “a verdade de Deus” - a Bíblia.
O sangrento historial do regime de al-Sisi de crimes contra o povo egípcio faz lembrar o regime do Xá do Irão, um antigo pilar da dominação regional norte-americana até à queda dele na revolução de 1979 que levou o Islão ao poder. Por si só, isto mostra que a oposição do regime de Trump ao Irão não tem nada a ver com a oposição à natureza completamente reacionária da República Islâmica, não tem nada a ver com promover o “bem” no mundo, e tem tudo a ver com reafirmar brutalmente o controlo da região em nome do seu próprio deus, e do seu próprio império, à custa da região e das pessoas de todo o mundo.