Edifício sinistro transformado em condomínio de luxo:
Indignação pelo futuro da antiga sede da PIDE
No passado dia 5 de Outubro, aproveitando o feriado que marca o derrube do que restava da monarquia feudal em Portugal, cerca de uma centena de pessoas juntou-se frente à antiga Sede da PIDE na Rua António Maria Cardoso, em Lisboa. O edifício está em vias de ser transformado em condomínio de luxo, consumando-se assim mais uma destruição da memória do fascismo e da repressão.
Pelo edifício da António Maria Cardoso passaram milhares de presos políticos durante as décadas em que aí esteve instalada a sinistra polícia política que assegurava a manutenção da ditadura fascista, na sua forma salazarista ou, nos anos finais, na sua pretensamente “mais branda” forma marcelista. Aí, os revolucionários, comunistas, anarquistas e mesmo democratas, foram detidos e torturados, algumas vezes até à morte.
Foi também frente à sede da PIDE que ocorreram as únicas mortes do 25 de Abril de 1974, gente assassinada pela PIDE, quando esta se recusou a render-se e disparou contra os manifestantes que exigiam a sua extinção e a prisão dos seus sinistros agentes. Várias pessoas morreram, embora a placa na parede da António Maria Cardoso apenas registe 3 nomes: João Arruda, Fernando Reis e José Barnetto.
Na verdade, os “democratas” capitães de Abril não tinham nenhuma intenção de destruir a PIDE, antes pretendiam continuar a usar a sua estrutura para manterem o novo poder, porque na realidade pretendiam salvar a ordem dominante ameaçada pela crescente influência dos revolucionários. Essa mesma polícia tinha assassinado pouco tempo antes Ribeiro Santos (uma das suas últimas vítimas) e tinha bastante experiência na perseguição aos opositores, em particular aos maoistas de então.
Como os capitães nem sequer planearam ocupar as instalações da PIDE, a população de Lisboa dirigiu-se imediatamente para a António Maria Cardoso para “explicar” aos torcionários o que é que pensava deles. Os disparos dos pides, encurralados e desesperados dentro do local que ainda horas antes pensavam ser o mais seguro, espalharam o sangue entre os manifestantes e aumentaram a sua ira. E foram os capitães de Abril que enviaram as tropas que salvariam a pele dos pides de um merecido correctivo.
A concentração de 5 de Outubro foi convocada através de correio electrónico e SMS por um grupo de jovens que não quer ver destruída a memória de todo esse sofrimento. Estiveram presentes algumas das pessoas que aí tinham estado presas e que manifestavam a sua indignação pelo apagamento dessa memória de uma tenebrosa repressão. Outras acções se seguirão para exigir um museu que relembre o que foi a PIDE e as décadas de fascismo.
Ao início da tarde, alguns manifestantes subiram a uma das varandas para aí colocar uma faixa com os nomes de algumas das vítimas da PIDE. Em destaque, estava o nome de Ribeiro Santos, bem como de outros resistentes ao fascismo, como Catarina Eufémia, Bento Gonçalves, Militão Ribeiro, José Dias Coelho e Humberto Delgado. Um manifesto (em anexo) foi distribuído e lido aos participantes. Gritou-se "Fascismo nunca mais!"
Como não podia deixar de ser, a classe dominante e os seus agentes, herdeiros da velha PIDE, não gostaram que tal acontecesse. Alguns agentes da nova PIDE à paisana tentaram, sem sucesso, fazer dispersar a concentração, provocando ainda mais a fúria dos presentes.
8 de Outubro de 2005
(Em anexo: o texto do comunicado distribuído na concentração)