Reproduzimos um documento do Partido Comunista do Irão (MLM) sobre a evolução da situação no Médio Oriente e Norte de África. Apesar de já ter sido publicado há algum tempo, mantém a sua importância, não só para essa região do globo como para todos os povos do mundo.
Do Irão para os nossos camaradas revolucionários no Médio Oriente e Norte de África
1º de Maio de 2011
Os povos da Tunísia, Egipto, Síria e Palestina também são o nosso povo! Os reaccionários e os imperialistas dividiram-nos em fronteiras, mas uma opressão e uma exploração comuns juntaram os nossos corações.
Quando os miseráveis da terra - escravos, camponeses, operários, mulheres e outros oprimidos - erguem as suas espinhas e desviam o seu olhar do chão para o horizonte da emancipação, inicia-se um novo capítulo da história - um capítulo em que deixam de ser vítimas sem voz e sem rosto, e passam a ser actores chave.
Num momento em que o sistema capitalista-imperialista mundial e as suas instituições que governam os diferentes países parecem perpétuos e em que a possibilidade de um mundo diferente não está imediatamente à vista, as lutas dos povos da Tunísia e do Egipto abriram um novo capítulo na história e trouxeram sorrisos aos rostos dos oprimidos e explorados do mundo. As insurreições destes povos foram um grande golpe na negra atmosfera de desespero e de aparentemente “eterna” existência da actual situação opressiva e sufocante desses países. Quando os protestos verbais de ontem se transformaram em revoltas indignadas em que os bandos corruptos dominantes caíram ao chão de uma forma indigna, iniciou-se uma fase entusiasmante do processo de desenvolvimentos do Médio Oriente. Quando esses povos agiram de uma forma poderosa para tomarem o seu destino nas suas próprias mãos, deram um cheiro de poder e esperança a todos os oprimidos do mundo porque criaram momentos que tornaram mais real a realização de sonhos aparentemente impossíveis.
Mohammed Bu Aziz de facto ateou o barril de pólvora desta região, o que, por sua vez, enviou ondas de choque para o Barém, Iémen, Jordânia, Argélia, Síria... e devastou os regimes clientes do imperialismo no mundo árabe, atraindo milhões de pessoas para a vida política e abrindo as portas para o florescimento da sua tremenda energia.
Mais que qualquer outra corrente política e social, foram os comunistas que deram as boas-vindas e acolheram no seu coração esta nova brecha. Por outro lado, a erupção destes vulcões populares fez estremecer até ao seu âmago os estados reaccionários da região, bem como os imperialistas europeus e norte-americanos que consideram esta região como chave para o seu domínio mundial. Eles estão a fazer o seu melhor para domesticarem estas insurreições.
Os levantamentos dos povos da Tunísia e do Egipto realmente inspiraram centenas de milhares de jovens e velhos no Irão e produziram entre o povo do Irão uma sensação de amizade e destino comum com os povos destes países. Estas insurreições deram um bom golpe nas podres ideias antiárabes e chauvinistas que foram produzidas e propagadas durante o regime do Xá, bem como durante o regime da República Islâmica. O grito do povo nas ruas da Tunísia e do Egipto que cantava “al shab yorid esghat-al-nizam” [O Povo Quer Derrubar o Sistema], recordou à corajosa juventude militante nas ruas de Teerão que deve romper com o programa e os objectivos reaccionários dos líderes do “Movimento Verde” - i.e. a “reformar o sistema” e “reavivar a era Khomeini”. Os protestos militantes de rua do povo de Teerão e de outros locais do Irão a 14 de Fevereiro de 2011, que gritavam: “Ben Ali, Depois Mubarak e agora Seid Ali” [o nome de Khamenei], forem indubitavelmente inspirados e deram as boas-vindas às insurreições na Tunísia e no Egipto.
Durante estas conjunturas inspiradoras as massas populares aprendem que os oprimidos - sejam eles iranianos ou árabes, latinos, africanos, asiáticos, europeus, etc. - são todos do mesmo grupo e os nossos inimigos também são do mesmo grupo. Nós, comunistas revolucionários do Irão, saudamos os povos da Tunísia, do Egipto, da Síria e de todos os outros lugares que se têm erguido para enterrarem a opressão e a exploração. Estamos orgulhosos deles e damos em elevado valor ao que até agora estas insurreições conseguiram.
A luta pela concretização de uma verdadeira revolução apenas começou. Ben Ali e Mubarak eram apenas os líderes dos regimes. Os regimes deles operavam máquinas de estado. E os estados deles são os protectores de um sistema económico e social opressor e explorador. As pessoas ergueram-se para derrubar o velho sistema e obtiveram importantes vitórias. Porém, têm à sua frente uma via tortuosa porque o velho sistema continua a dominar e ainda não foi destruído. Foram criadas grandes oportunidades para a construção de um mundo diferente. Mas também há grandes perigos a ameaçar as recém-nascidas revoltas populares.
A questão é: qual o caminho a seguir e como será ele desbravado? Sem dúvida que uma repetição da amarga derrota da revolução iraniana ainda não é um dado certo. As lições dessa revolução derrotada podem ser de um imenso valor para os combatentes nos países do Médio Oriente e Norte de África. Quando essa revolução foi derrotada, perdeu-se uma das raras oportunidades de transformação revolucionária no Irão e de mudança radical do rosto do Médio Oriente. Usemos a unidade internacionalista para impedirmos a repetição dessa perda sob uma nova forma. Façamos com que os povos do mundo celebrem orgulhosamente a vitória de uma autêntica revolução nesta região.
A derrota da revolução no Irão
Em 1979, milhões de operários, camponeses, estudantes e nacionalidades oprimidas ergueram-se no Irão e derrubaram o regime do Xá, o qual tinha sido o produto de um golpe de estado liderado pela CIA contra o regime do Dr. Mossadegh em 1953. Esse acontecimento apanhou muita gente de surpresa, sobretudo porque um ano antes o Presidente Carter dos EUA tinha declarado que o Irão com o Xá era “uma ilha de estabilidade no Médio Oriente”. Em resultado da queda do Xá, abriram-se fissuras no domínio norte-americano do Médio Oriente.
Quando a sociedade iraniana explodiu, uma diversidade de forças políticas saltou para a luta para imporem os seus programas políticos e sociais e controlarem o futuro do povo do Irão. Entre elas estavam os fundamentalistas islâmicos que tinham sido cúmplices do golpe de estado CIA-Xá de 1953. As potências imperialistas também se mobilizaram desesperada e activamente para impedirem o derrube total do estado da classe dependente do imperialismo e a eliminação do sistema capitalista no Irão. Com esse fim, optaram por se unir aos fundamentalistas islâmicos. Abriram caminho a que Khomeini, a corte dele e os seus aliados subissem ao poder e transformassem em primeiro lugar a revolução numa contra-revolução com a sua ajuda. Às ordens dos EUA, o exército do Xá mudou de lealdade e tornou-se no exército de Khomeini. Com muitas ilusões, as massas acolheram ingenuamente os tanques do exército e os soldados com flores. A mudança do slogan popular “Liberdade-Independência” para “Liberdade-Independência-República Islâmica” assinalou o início de uma catástrofe, mas o povo não se apercebeu disso.
Após a queda do regime do Xá, a aliança fundamentalista islâmica liderada por Khomeini reestruturou o velho despotismo para a nova forma de despotismo religioso. Foram ajudados nessa tarefa por partidos burgueses que se tinham oposto ao regime do Xá. Num referendo organizado pela nova aliança governamental, a maioria das pessoas votou “sim” à República Islâmica. Além do Exército, foi organizada uma nova força armada chamada Companhia Pasdaran. Baseada nos quadros da segurança do regime do Xá - a infame SAVAK - o novo regime recuperou e reorganizou o aparelho de segurança. A velha Constituição foi substituída por uma nova Constituição teocrática cem vezes mais reaccionária - porém, na República Islâmica, tal como durante o regime do Xá, de qualquer maneira a lei não tem importância.
Várias semanas após a ascensão de Khomeini ao trono da monarquia islâmica, ele desencadeou um ataque aos direitos das mulheres e emitiu a Ordem do Hijab Obrigatório. Esse ataque descarado funcionou como primeiro golpe nas ilusões populares. Ficou então claro - pelo menos para as mulheres rebeldes do Irão - que o que tinha chegado ao poder não era uma revolução mas sim uma terrível contra-revolução. Khomeini ordenou a sangrenta repressão do movimento das massas árabes do Khuzestão [no Irão meridional]. O Exército e os Pasdaran atacaram os camponeses que se tinham levantado para ocuparem terras e atacaram os povos oprimidos de nacionalidades que exigiam uma igualdade nacional em regiões como Turkuman, Sahra e o Curdistão. Os bandos do Hezbollah e das forças de segurança atacaram os comités operários, as associações camponesas, as organizações estudantis, os comités de enfermeiros e trabalhadores dos hospitais, os professores das escolas e das universidades, etc. A maioria desses órgãos de poder das massas tinha sido criado durante a mobilização e a organização para o derrube do regime do Xá. E muitos deles eram liderados por comunistas revolucionários que tinham vindo da clandestinidade e do exílio e que estavam a organizar as lutas revolucionárias e a dar o poder às massas de operários, camponeses e trabalhadores da sociedade. Foi o início de uma intensa luta entre a revolução e a contra-revolução.
Essa contenda ocorreu num quadro mais vasto da situação mundial. Na altura em que o povo do Irão se levantou para derrubar o regime do Xá e os seus amos norte-americanos, a contra-revolução já estava a tomar conta do mundo. Os movimentos sociais no Ocidente tinham-se esbatido, os movimentos anticoloniais e nacionalistas dos anos 50 na Ásia e em África, que tinham obtido vitórias sob a liderança de forças das burguesias nacionais, tinham fracassado miseravelmente sem terem conseguido criar uma sociedade “melhor”. Na maioria desses movimentos, as forças comunistas eram marginais. Em muitas circunstâncias, elas tinham-se dissolvido em Frentes lideradas por forças burguesas ou sido massacradas por forças islâmicas ou nacionalistas ou pelos próprios imperialistas [por exemplo, nos anos 60 na Indonésia, centenas de milhares de comunistas foram mortos em operações conjuntas CIA-Exército].
Um outro factor internacional que tornou a situação muito desfavorável aos comunistas revolucionários foi a morte de Mao Tsétung em 1976 e a subsequente restauração do capitalismo na antiga China socialista. Esse acontecimento foi a pior derrota da revolução mundial. Um grande e populoso país, que antes era uma base da revolução mundial proletária, transformou-se numa base do sistema capitalista mundial. A China mudou de país na via socialista para um brutal país capitalista. Essa mudança em sentido inverso teve um imenso impacto negativo no mundo. Entre os oprimidos do mundo, o sentimento de que a revolução socialista era a única forma de emancipação ficou enormemente enfraquecido. Iniciaram-se campanhas internacionais sobre a “morte do comunismo” promovidas pelas potências mundiais. Além disso, a contenda entre os dois blocos imperialistas em disputa - o bloco ocidental liderado pelos EUA e o bloco de leste liderado pela ex-União Soviética - tornou a situação extremamente complicada. [Na altura, a então União Soviética era um país imperialista capitalista de estado para a qual o socialismo era apenas uma máscara conveniente!].
Além desta situação desfavorável, as forças comunistas do Irão também representaram um papel negativo - i.e., não publicaram um programa único de âmbito nacional para o derrube e destruição do velho estado e para a instauração de um novo estado com um programa de revolução social. A maioria dos comunistas baseou as suas esperanças no desenvolvimento espontâneo e na transformação do movimento operário numa revolução socialista. Mas a revolução não é um acontecimento espontâneo. E se for deixada à espontaneidade, as forças organizadas das classes reaccionárias assumirão com certeza a liderança das massas e imporão o seu programa político e social. As forças comunistas não levaram a sério o carácter teocrático do novo regime e chegaram mesmo a fechar os olhos à revolta das mulheres contra ele [uma revolta contra a Ordem do Hijab Obrigatório de Khomeini que durou 5 dias iniciada a 8 de Março de 1979]. O carácter teocrático do estado tinha acentuado objectivamente a tarefa de levar a cabo uma luta ideológica e de se desenvolver uma crítica corajosa da religião. Mas as forças comunistas do Irão no essencial viraram as costas a essa tarefa, pensando que a chave para afastar a influência ideológica do regime islâmico era realçar os “problemas económicos” e esperar que, com a “degradação da situação económica”, os operários entrassem em greve e que posteriormente iniciassem uma insurreição. O resultado deste ponto de vista foi uma linha puramente economicista que centrava a atenção dos trabalhadores nos seus problemas “imediatos”. Mas a verdade é que com a instauração da República Islâmica foi esmagado o mais importante direito dos trabalhadores - ou seja, a revolução, a qual trazia consigo a possibilidade de tomada do poder e de construção de uma nova sociedade baseada na abolição da opressão e da exploração, foi roubada e a classe operária foi privada dessa oportunidade histórica. Este era o problema mais urgente da classe operária e das outras forças sociais oprimidas e exploradas da sociedade. Mas, na altura, as forças comunistas foram incapazes de exprimir e representar esta necessidade.
Além disso, surgiu uma grande divergência em relação à natureza da oposição entre a República Islâmica e o imperialismo norte-americano. Surgiu no movimento uma linha de direita que desacoplava a luta contra o imperialismo da luta contra as forças governamentais islâmicas reaccionárias. Quando o cerne da questão era que as potências imperialistas e as classes reaccionárias “nativas” são momentos diferentes de um único sistema mundial de classe. A contradição entre o fundamentalismo islâmico e o imperialismo que tem marcado o cenário político do Irão e do Médio Oriente tem uma natureza reaccionária e, na realidade, os dois extremos dessa contradição representam sistemas sociais podres e reaccionários e devem ser derrubados.
Estes factores objectivos e subjectivos surgiram em conjunto e abriram caminho à tomada do poder pelas forças fundamentalistas islâmicas do Irão em 1979. A crise revolucionária que tinha absorvido a sociedade foi resolvida de uma forma negativa e trouxe três décadas de catástrofe para a classe operária e o povo do Irão e teve um imenso impacto negativo na corrente da revolução no Médio Oriente, bem como no mundo, e reforçou a atmosfera contra-revolucionária. É verdade que os comunistas revolucionários do Irão estavam dispersos e envolvidos numa crise política e ideológica, mas eles lutaram heroicamente para impedir que a revolução fosse abortada e transformada numa contra-revolução. A batalha entre a revolução e a contra-revolução desenvolveu-se violentamente nas fábricas, nas universidades, no campo, dentro dos conselhos das escolas e dos hospitais e nos campos de batalha das guerras revolucionárias. No final, a República Islâmica conseguiu consolidar o seu domínio.
A consolidação do sistema teocrático no Irão foi de facto um episódio da situação mundial global e do domínio unilateral da contra-revolução.
As insurreições na Tunísia e no Egipto criaram uma nova vaga de esperança no mundo. A luta nesses países pode saltar para níveis mais elevados e levar as massas revolucionárias a um sério confronto com o todo dos estados dominantes. Trata-se de estados das classes exploradoras locais que estão ligadas ao sistema capitalista mundial e que têm como coluna vertebral a lei e as forças da ordem, como o exército.
Face a este novo capítulo da luta de classes, quais são as tarefas dos comunistas nestes países, bem como em toda a região e no mundo? Conseguirá esta nova vaga da luta de classes superar o resultado das vagas contra-revolucionárias e anticomunistas das últimas quatro décadas e pôr a revolução no ponto mais alto das insurreições dos povos do Médio Oriente e Norte de África, bem como de todo o mundo? Conseguirá abrir as mentes das pessoas para o comunismo e a revolução comunista como única forma de se libertarem dos miseráveis sistemas reaccionários desses países, bem como do sistema capitalista mundial?
Colocar a revolução de novo no ponto mais alto dos movimentos
A revolução é um campo de disputa e desafio de diferentes classes. Vimos isso na experiência do Irão e podemos ver isso hoje na Tunísia, no Egipto e noutros países em que os povos se levantaram.
Na Tunísia, no Egipto e noutros países, por um lado os centros de poder nacionais e internacionais tentam acalmar e satisfazer as pessoas fazendo-lhes algumas cedências miseráveis ou, no máximo, mudando os guardiões do sistema. Por outro lado, há uma tremenda oportunidade e o potencial para desferir mais golpes ao antigo sistema e por fim esmagá-lo através de uma genuína revolução. São duas vias radicalmente diferentes. Se a segunda via ganhar, sem dúvida que mudará radicalmente a face desta região e do mundo a favor dos povos desta região, bem como de todo o mundo. Mas para fazermos com que a segunda via se torne vencedora, milhões de pessoas devem ficar a saber o que é uma verdadeira revolução e qual é a essência da sociedade de que elas precisam e querem e qual o tipo de liderança de classe que pode liderar o caminho para lá se chegar. Sem que milhões de pessoas tomem consciência desta via e sejam organizadas para lutarem por esse objectivo, os inimigos podem vender tudo ao povo em nome da “revolução”. Vimos isso no caso da revolução iraniana de 1979. Como resultado, no Irão, a situação permaneceu basicamente a mesma ou ficou mesmo pior. Se o povo não tiver um movimento comunista revolucionário que possa promover a resposta à pergunta “o que é que queremos?” do ponto de vista do proletariado e dos outros oprimidos e explorados da sociedade e liderar as massas na luta por esse objectivo; se não tivermos isso, as classes reaccionárias e os seus representantes imporão às massas o seu próprio programa e dir-lhes-ão “o que é que elas devem querer”.
Para que a totalidade das estruturas políticas dominantes sejam esmagadas por um povo consciente e revolucionário, para que se forje um novo estado de classe que queira e possa tomar o poder e o património aos capitalistas e aos grandes proprietários rurais, bem como aos imperialistas, um estado que possa anular as distinções de classe e abolir todas as relações sociais de opressão - tudo isto é um processo difícil e sangrento que será impossível de alcançar sem um partido revolucionário (um Partido Comunista) e sem um exército que pertença ao povo e constituído pelo povo.
Mas como iniciar um processo destes? Será que destes grandes movimentos irá emergir um novo movimento comunista cujo programa central seja liderar uma genuína revolução? Estas são questões urgentes que devem ser respondidas e podem ser respondidas pelos revolucionários destes países.
As manobras das diferentes forças políticas e sociais para imporem o resultado da luta
Quando ficou claro às potências imperialistas que já não podiam salvar os seus clientes Ben Ali e Mubarak, elas de repente tornaram-se apoiantes dos “povos” da Tunísia e do Egipto para estarem em posição de conterem a crise política nesses países e de assumirem o controlo e liderarem a “transição” para um novo regime. Obama exprimiu alegria pela queda de Mubarak. Sarkozy anunciou a sua intenção de manter a França “sempre” do lado dos povos árabes e de enfrentar os regimes reaccionários desses países! Estas pessoas não conhecem limites para as mentiras e artimanhas. Agora, sob o disfarce de uma “intervenção humanitária”, invadiram a Líbia e estão a trabalhar para criar um regime pós-Kaddafi, tentando agregar alguns dos repugnantes ex-generais e ex-ministros de Kaddafi que vergonhosamente saltaram fora do seu navio naufragado.
Em suma, as forças reaccionárias desses países e os imperialistas estão atarefados a tentar impedir o papel das massas e a bloquear o desenvolvimento da consciência delas e o movimento por uma mudança radical.
Na Tunísia, as sobras de Ben Ali estão a tentar preservar as suas trincheiras. No Egipto, o exército, que era a coluna vertebral do regime de Mubarak, está a tentar manter o sistema de Mubarak sem Mubarak. Durante as últimas três décadas, esse exército esteve envolvido em três processos: o primeiro, de garantir a existência de Israel; o segundo, de reprimir o povo do Egipto; e o terceiro, de abrir as portas do Egipto ao neoliberalismo económico desenfreado que levou, por um lado, a uma pobreza e desemprego sem precedentes e, por outro, à formação de uma fabulosa riqueza nas mãos dos capitalistas ligados ao estado.
Outras forças sociais reaccionárias como a Irmandade Muçulmana também tentam cavalgar o movimento popular e chegar a um novo arranjo com as principais facções das classes dominantes. É verdade que a força e a influência dos fundamentalistas islâmicos no Egipto não são iguais à dos fundamentalistas islâmicos no Irão durante a revolução de 1979. Mas esses reaccionários podem chegar a acordo com os imperialistas e com Israel - que estão desesperadamente a tentar impor a “estabilidade” no Egipto e impedir o contágio do fogo a outros países da região - e a tentar sair da sua necrópole histórica e tornar-se suseranos do povo. Os EUA e as potências europeias estão a negociar com os líderes desse partido e a propor-lhes que “aparem” o seu Islão para que fique como o AKP (Partido da Justiça e do Desenvolvimento) da Turquia e para que se preparem para fazerem parte do poder. Do ponto de vista dos imperialistas, esse “aparar” não tem a ver com o programa social da Irmandade. Tem a ver com aceitarem duas coisas: uma, manterem os acordos de Camp David com Israel e garantirem o actual estatuto do Canal do Suez - como ponto central da dependência política e militar do Egipto em relação ao sistema imperialista mundial - e dois, não criarem dificuldades ao capital estrangeiro nas diferentes áreas de produção e turismo - i.e., os grilhões que amarram o Egipto ao sistema capitalista mundial.
Os acontecimentos no Egipto mostram que para impedir a destruição do movimento popular que tem o potencial para despoletar uma genuína revolução é extremamente necessário criticar a religião enquanto estrutura de opressão e exploração e popularizar essa crítica. Combater o antigo sistema também inclui desafiar o programa político, económico e ideológico da Irmandade e outras estruturas políticas islâmicas do Médio Oriente (tais como os líderes do Movimento Verde no Irão, o Hamas na Palestina e o Hezbollah no Líbano, etc.). Podemos ver hoje o germinar desta consciência entre a nova geração de militantes nos países árabes e, especificamente, é significativo que o movimento das mulheres na Tunísia tenha erguido a reivindicação da separação entre religião e estado.
É muito importante conhecer os complexos métodos que os imperialistas e os inimigos de classe utilizam. Os imperialistas e as classes dominantes reaccionárias locais dos países do terceiro mundo são mãos velhas a actuar para impedirem que os movimentos populares obtenham a vitória. Onde e quando não conseguem esmagar esses movimentos, eles produzem uma mistura diversificada de forças de classe da antiga ordem em nome da “mudança” e restabelecem gradualmente a anterior situação. Nesse sentido, eles também recrutam a ajuda de forças políticas burguesas que nos anteriores regimes estavam na “oposição”. Por vezes, mesmo as forças revolucionárias que durante muitos anos lutaram pelo derrube dos estados reaccionários e fizeram tremendos sacrifícios caem na armadilha das chamadas “soluções democráticas” dessas potências e participam nos seus jogos políticos e, dessa forma, dão legitimidade aos processos de “transição” reaccionários e imperialistas e ajudam a que eles refaçam a sua antiga ordem quando esta tinha sido estilhaçada por grandes lutas.
Recordemos os processos que os imperialistas e as forças das classes burguesas locais engendraram nas Filipinas nos anos 80, bem como na Indonésia nos anos 90. Nas Filipinas o odiado Marcos e na Indonésia o odiado Suharto foram derrubados. Os dois foram chefes de regimes reaccionários sangrentos e corruptos que eram estados clientes do imperialismo. As massas populares - os operários, os camponeses e os intelectuais - ergueram-se contra eles. Mas também as forças burguesas e reaccionárias que estavam na oposição a esses dois bandos dominantes saltaram activamente para a cena política e estabeleceram um acordo com os imperialistas, obtiveram uma parcela do poder político e, em troca, ajudaram a esquematizar processos de “transição” favoráveis aos imperialistas e aos capitalistas e grandes proprietários rurais desses países. A revolução iraniana também se transformou numa horrenda contra-revolução com a cooperação entre os imperialistas e os fundamentalistas islâmicos, bem como as forças nacionalistas burguesas.
Se, em 1979, os operários, os camponeses, as mulheres, os jovens e os intelectuais do Irão tivessem tido um partido como o Partido Bolchevique liderado por Lenine (durante a Revolução de Outubro de 1917) ou um partido como o Partido Comunista da China liderado por Mao Tsétung (durante a revolução chinesa que chegou à vitória em 1949 após muitos anos de condução de uma guerra revolucionária); se o povo tivesse um partido assim que pudesse unir pelo menos uma parte das recém-despertadas massas em torno do programa de uma Revolução de Nova Democracia e Socialismo e que, baseando-se nelas, organizasse um exército vermelho para esmagar o antigo estado - e sobretudo a sua coluna vertebral militar - e que repelisse os fundamentalistas islâmicos, hoje o Irão e mesmo todo o Médio Oriente seria radicalmente diferente.
Nos últimos anos também temos enfrentado outras experiências amargas. No Nepal, as forças revolucionárias sob a liderança do Partido Comunista do Nepal (Maoista) liderou uma inspiradora Guerra Popular que teve início em 1996 e durou dez anos. Mas, depois de terem derrubado a monarquia, fizeram um acordo com os imperialistas e as forças burguesas e reaccionárias desse país e passaram a participar no estado. Dessa forma, ajudaram a refazer o mesmo velho sistema, desta vez em nome de uma República. A situação das massas nepalesas, que durante dez anos se sacrificaram, não foi alterada e esse país continuou sob o controlo do sistema capitalista mundial e das classes de capitalistas e grandes proprietários rurais locais - tal como os outros países dessa região.
Estas experiências mostram que todos os caminhos do “meio” levam necessariamente à reestruturação do mesmo velho sistema sob novas formas. Os países do Médio Oriente têm suficiente experiência de diferentes tipos de caminhos do “meio”. Agora, é tempo de pôr a revolução - uma verdadeira revolução - no palco central desta região.
As doces experiências de revoluções vitoriosas e as amargas experiências de revoluções falhadas não têm fronteiras. São experiências internacionais porque as classes burguesas e as classes proletárias são ambas internacionais. Não há nenhuma razão para se re-experimentar as amargas experiências anteriores. Hoje em dia, os povos da região estão a observar a Tunísia e o Egipto para verem se o povo pode finalmente quebrar o “feitiço” da derrota e produzir genuínas revoluções nesta região.
Ilusões da classe média
As correntes e as ideias das classes médias são sempre um grande peso sobre os movimentos sociais. Essas classes tendem em geral para “soluções” do “meio”. Opõem-se ao derrube revolucionário dos estados no seu todo e querem limitar os objectivos dos movimentos a meras “reformas” da estrutura política desse mesmo sistema. E têm medo da “radicalização” dos movimentos e do despontar de uma liderança comunista. O predomínio de uma atmosfera ideológica contra-revolucionária no mundo durante as últimas 4 décadas fortaleceu enormemente estas correntes em todo o mundo. As potências imperialistas viram isto como uma corrente ideológica favorável e favoreceram o seu desenvolvimento. Com a ofensiva ideológica anticomunista dos imperialistas e dos seus seguidores intelectuais, essas correntes fortaleceram-se e ajudaram a propagar a ideia reaccionária e imperialista da “morte do comunismo”.
Hoje em dia, embora o capitalismo tenha sido embaraçosamente exposto em todas as suas diferentes formas, sobretudo a sua mais recente globalização neoliberal, embora o fundamentalismo islâmico tenha mostrado a sua face repulsiva e as forças nacionalistas tenham mostrado a sua absoluta incapacidade para produzirem a mais pequena mudança a favor das massas oprimidas e exploradas, eles continuam a tocar descaradamente o tambor da “morte do comunismo”.
Mais cedo ou mais tarde, os representantes políticos das correntes da classe média irão fazer alianças com os partidos políticos reaccionários no poder e com os imperialistas. E ao fazê-lo irão sempre alegar: “Neste momento não há outro caminho”. Um exemplo disto é o “Movimento Verde” no Irão que emergiu em 2009 na sequência da fraude eleitoral do bando governamental de Ahmadinejad contra a chamada ala “reformista” da República Islâmica. O estabelecimento da liderança de uma ala do regime sobre esse movimento mostrou uma vez mais como as classes médias se submetem à liderança de correntes reaccionárias e tentam levar com elas todo o movimento popular. O predomínio deste tipo de corrente em qualquer movimento é a sua morte como movimento transformador e libertador.
As correntes políticas que concentram a perspectiva e os sentimentos da classe média tentam limitar conscientemente as revoluções ao derrube dos “ditadores”. Mas deveríamos perguntar-nos: Será que ditadores como o Xá, Marcos, Suharto e outros ditadores semelhantes não foram derrubados? Eles foram derrubados, mas o seu estado e o seu sistema de classe permaneceram! Derrubar esses “ditadores” é muito importante porque eles são expressões concentradas do sistema dominante. Mas eles não são a totalidade do sistema. Se o seu sistema e estrutura de estado permanecerem intactos, mais cedo ou mais tarde será produzido um outro “ditador”. Não devemos reduzir uma “ditadura” aos indivíduos despóticos que são os símbolos desses sistemas. A totalidade desses sistemas são ditaduras das classes capitalistas. E os seus estados são estados de ditadura de classe dessas classes sobre a classe operária, o campesinato e os outros trabalhadores da sociedade.
Hoje em dia, na maior parte do mundo, a ausência de um pólo comunista revolucionário no interior das rebeliões sociais é o mais importante obstáculo na via para transformar essas rebeliões em movimentos revolucionários. Este problema não pode ser resolvido através da adopção de soluções do “meio”. Mesmo ao nível “táctico”, a melhor solução para este problema é a edificação de um pólo comunista revolucionário no coração das actuais insurreições e não relegar essa tarefa para um tempo “posterior e mais favorável”.
Um movimento comunista, uma necessidade urgente
Hoje em dia, os imperialistas e um diversificado conjunto de forças de classe estão a tentar arduamente impedir que a actual crise política no Médio Oriente e Norte de África se transforme numa crise revolucionária. O que é que a nossa classe - o proletariado - vai fazer?
A tarefa mais importante e urgente do proletariado é divulgar a sua solução comunista e indicar o caminho.
Durante as últimas décadas, as forças comunistas no Médio Oriente têm, durante a maior parte do tempo, tentado conquistar o apoio das massas por serem democratas em vez de propagarem corajosamente as teorias e as políticas comunistas e de construírem colunas vertebrais comunistas entre os operários, as massas comuns das cidades e dos campos, as mulheres oprimidas, os jovens rebeldes e os estudantes militantes. É por isso que podemos dizer que, durante a maior parte do tempo, nós os comunistas não temos sido comunistas. Por outro lado, os fundamentalistas islâmicos, cujas ideias representam uma tenebrosa sociedade reaccionária, têm propagado apaixonadamente a sua ideologia e os seus valores sociais. Claro que devemos recordar que durante a maior parte do tempo eles tiveram o apoio dos imperialistas e de Israel, enquanto os comunistas foram sempre perseguidos e obrigados a trabalhar clandestinamente. Contudo, não devemos esquecer uma verdade histórica: as forças comunistas só se tornaram num pólo na sociedade e criaram raízes entre os oprimidos e explorados, e sobretudo entre a classe operária, apenas quando não esconderam as suas ideias e corajosamente puseram em prática o seu programa social e a sua estratégia política revolucionária de tomada do poder. E nós temos trabalhado arduamente para isso. As massas oprimidas e exploradas avaliam-nos - aos comunistas - pelos nossos pensamentos, pelo nosso programa de construção de uma sociedade e um mundo diferente e não pelo nosso “democratismo” e pela nossa compaixão pelo seu pão diário. A divulgação e propagação dos nossos pontos de vista, caminho, programa e ideologia comunista entre o povo não é uma tarefa para o futuro. É crucial e urgente abrir um caminho diferente dos propostos pelos imperialistas e pelas forças reaccionárias e burguesas.
Os povos do Médio Oriente e do Norte de África têm sofrido as mais cruéis formas de colonialismo e imperialismo; têm conhecido a bancarrota do nacionalismo nas suas diferentes versões de mossadeghismo, nasserismo, bathismo e arafatismo; conhecem o fundamentalismo islâmico que tem desviado os movimentos anti-imperialistas desta região e fornecido ao povo as mais reaccionárias e medievais relações sociais e culturais em nome do “caminho para a emancipação”.
A maior verdade que as realidades das últimas décadas nos países do Médio Oriente provam é que sem um movimento comunista, sem a presença de um pólo comunista na sociedade, as massas populares não obterão a consciência necessária sobre porque é que o sistema político-económico-social capitalista (seja na forma de uma república laica ou uma monarquia, de regimes islâmicos ou militares) perpetua um incontável número de crimes. E qual é o significado de uma nova ordem social. Além disso, sem a consciência necessária, elas não podem medir a verdadeira natureza das forças políticas activas no terreno nem as suas alegações e promessas. Sem um movimento comunista (e com isto estamos a falar de um movimento comunista revolucionário que enfrente o sistema dominante e não dos partidos ditos comunistas que se tornaram parte essencial do funcionamento dos sistemas dominantes), as massas populares nunca poderão idealizar um sistema político, económico e social radicalmente diferente. Nunca poderão saber a verdadeira história das revoluções socialistas do século XX na Rússia e na China e as espantosas transformações que elas introduziram na condição humana.
Para haver uma revolução é necessário um partido revolucionário
Para liderar a luta pela revolução é necessário um centro político - mas não qualquer forma de centro político. É necessário um centro com uma linha revolucionária - um centro que dê os passos de hoje com um olho no desencadear da revolução. O proletariado e as outras massas oprimidas e exploradas não podem atravessar vitoriosamente a via tortuosa da revolução sem terem a sua própria liderança política, um partido político. Eles nunca poderão ver e analisar os interesses de classe por trás das ardilosas promessas e alegações dos actuais partidos políticos apenas com base nos seus impulsos. Um partido comunista não é uma seita nem um grupelho político da sociedade. É uma perspectiva do mundo e um programa político e social. É um caminho.
Um partido comunista é o partido de uma classe. O proletariado é a classe de cujo labor depende o funcionamento desta sociedade opressora. E o proletariado é ele próprio uma vítima do funcionamento deste sistema. É por isso que o proletariado não tem nada a perder com o derrube total deste sistema, a não ser os seus grilhões. Mas individualmente os proletários não têm consciência desta verdade. Muitos deles tendem a colocar-se sob as asas dos programas dos partidos burgueses. Temos de ser francos e honestos com as massas populares. Devemos mostrar-lhes as suas ilusões e salientar-lhes que um reduzido nível de consciência conduz sempre as pessoas a ajudarem honesta e ingenuamente os seus próprios inimigos.
É tarefa dos partidos proletários desenvolver essa consciência nas massas oprimidas e exploradas e organizá-las para desencadearem uma revolução proletária.
Além disso, uma revolução proletária não pode chegar à vitória sem uma vasta frente de todas as classes e estratos descontentes. Todos aqueles que sentem repugnância por este sistema podem encontrar lugar sob a bandeira da revolução proletária e juntar-se ao proletariado sem que eles próprios se tornem comunistas. Em vez de o proletariado se juntar aos programas democráticos burgueses de outras correntes descontentes, são elas que se devem juntar ao proletariado em torno do programa da Revolução de Nova Democracia. Sim, é preciso uma Frente! Mas deve ficar claro: com base em que estratégia política, para pavimentar que tipo de estrada, para lutar por que programa social? Em suma: sob a liderança de que classe?
Lutemos contra a maré anticomunista e anti-liderança do partido que é dominante no mundo. Realcemos que as massas populares precisam de uma liderança comunista. Porque só os comunistas propõem a verdadeira solução para a sua emancipação. Rasguemos a cobertura com que os imperialistas e reaccionários cobriram os sonhos de libertação das pessoas e afastemos os argumentos vazios: passo a passo, depois de uma mudança democrática, depois do derrube dos ditadores, etc.
Uma vez mais a revolução; uma vez mais o desejo de uma tomada revolucionária do poder
Hoje em dia, os comunistas revolucionários nos países do Médio Oriente e Norte de África estão enfraquecidos e são pouco numerosos. Porém, se essas mesmas forças de pequena dimensão fizerem um balanço correcto das experiências das revoluções socialistas do século XX na Rússia e na China e à luz da análise dos extraordinários feitos e também das importantes fragilidades dessas revoluções, chegarem a uma compreensão mais desenvolvida da natureza e das coordenadas das futuras sociedades socialistas e estados de ditadura de proletariado; e se, além disso, analisarem as mudanças que ocorreram nas estruturas socioeconómicas das diferentes sociedades da região e à luz disso elaborarem uma estratégia revolucionária vitoriosa para esses países - então, essas mesmas forças de pequena dimensão poderão influenciar enormemente a situação objectiva.
A nossa tarefa não é determinada pela actual situação. Qualquer situação está cheia de contradições e pode ser alterada pela acção revolucionária. As iniciativas corajosas das forças comunistas revolucionárias - desde que com base na dinâmica objectiva em acção - podem ter um impacto chocantemente transformador na situação e mudar as coordenadas da cena política a favor de uma genuína revolução.
É claro que os revolucionários não podem liderar a revolução da forma que desejariam e apenas com base na sua vontade. Mas também é claro que na actual atmosfera ideológica que foi moldada por várias décadas de campanhas internacionais de “morte do comunismo” e “morte da revolução”, o perigo principal não é o voluntarismo revolucionário e o excesso. Hoje em dia, o “realismo” está na moda. Relegar a revolução e a estratégia revolucionária para “mais tarde” está na moda. Render-se às “reformas democráticas” é a moda. Ceder às vozes “democráticas” e apelar aos comunistas para se manterem quietos e assumirem a perspectiva e o programa democrático-burguês é a moeda corrente.
Mas os comunistas não podem nem devem alinhar com essa corrente, porque milhões de pessoas acabaram de entrar na vida política e nesta arena agitada estão à procura de um caminho; à procura de um futuro com significado - um futuro que só é possível com transformações socialistas revolucionárias.
As revoluções socialistas do século XX e depois delas
Os comunistas de todo o mundo em unidade com os comunistas da Tunísia, Egipto, Síria e Palestina... têm o dever de clamar bem alto que o socialismo é um milhão de vezes melhor que o capitalismo e que o comunismo, que é o objectivo final e a tela do socialismo, é cem vezes melhor que o socialismo. As revoluções socialistas do século XX foram grandes triunfos para a emancipação da humanidade. Sob a liderança dos comunistas revolucionários e fazendo a revolução socialista, a China foi libertada. Antes disso, era um país com centenas de milhões de camponeses famintos que viviam na servidão, em que as mulheres eram escravas dos homens e em que uma grande cidade como Xangai tinha sido dividida entre as potências coloniais francesa, britânica e alemã e onde nos seus restaurantes estava escrito: “Proibido a cães e a chineses”! Antes da revolução socialista de 1917, a Rússia vivia subjugada por um severo sistema feudal e era governada pelo despotismo czarista. A opressão das nacionalidades era tão repulsiva e omnipresente na Rússia que se dizia que era uma “prisão de nações”. Os operários das fábricas morriam de tuberculose aos milhares nas suas casas miseráveis. Antes da revolução socialista, a China vivia subjugada pelo colonialismo e pelo feudalismo. Era um país faminto e também atrasado, absorvido pela religião e pela superstição. A revolução removeu todas essas cicatrizes do rosto da sociedade numa questão de apenas alguns anos. Através das revoluções socialistas, a Rússia e a China conseguiram realizar em apenas alguns anos o que os países europeus precisaram de centenas de anos. Comparemos essas incríveis mudanças com os movimentos anticoloniais dos anos 50 na Ásia e em África que foram liderados por forças nacionalistas. Esses movimentos geraram grande entusiasmo e esperança mas nunca poderiam eliminar as retrógradas relações feudais nem romper com o sistema capitalista mundial. E, após grandes lutas e tremendos sacrifícios das pessoas, os sistemas de opressão e exploração foram reestruturados com um rosto diferente. Ou vejamos o caso do Irão. As forças políticas islâmicas saltaram para a traseira do carro do movimento popular antimonárquico e cavalgaram-no para chegarem ao poder. Elas não só salvaguardaram as bases do próprio sistema como o tornaram ainda pior. A diferença entre as revoluções socialistas e outras “revoluções” é qualitativamente imensa. Esta verdade deve ser reconhecida e propagada corajosamente e deve tornar-se parte da consciência de milhões de elementos das massas.
Mas também se deve reconhecer que esses países socialistas não conseguiram superar a resistência e a regeneração das relações burguesas e de resistir ao cerco do sistema capitalista mundial. O capitalismo acabaria por ser restaurado nesses países e o socialismo foi enterrado. Hoje podemos ver que a China se tornou numa das sociedades mais exploradoras e opressoras da Terra. A questão não é saber se o socialismo é um sistema social superior. A questão é: como é que vamos construir as futuras sociedades socialistas muito melhor que as sociedades socialistas do século XX? Como é que podemos desarticular o perigo da reprodução das relações de opressão e exploração e salvaguardar essas sociedades face aos ataques da burguesia e do sistema capitalista mundial e, ao mesmo tempo, mantê-las como sociedades dinâmicas e vibrantes?
Que tipo de revolução e sob que tipo de liderança
Muitos dos jovens militantes nos países árabes têm, nesta pequena experiência dos últimos meses, compreendido o facto de que o sistema (que consiste nos líderes e nas instituições políticas e económicas) não alterará as suas formas e meios de opressão e exploração. Por isso, eles estão à procura da resposta à pergunta “Que fazer?”. A resposta deveria ser dada pelas forças comunistas revolucionárias desses países. Se esta questão não for resolvida, mais cedo ou mais tarde, a energia e a esperança dos jovens que têm sido a força motriz destas insurreições dissipar-se-ão. E os vencedores do “jogo” serão necessariamente essas forças de classe que esgrimem a sua ideologia de classe e o seu programa social. E que mobilizam e organizam a sua base social em torno dessa ideologia e desse programa social.
Por outro lado, se os jovens revolucionários se unirem à perspectiva comunista e a tornarem na tela das suas lutas, os movimentos desta região atravessarão uma tremenda mudança qualitativa e serão conseguidas grandes oportunidades revolucionárias. Como continuar a luta? Com que objectivos? Que tipo de revolução é necessário e o que é uma liderança revolucionária? Como retirar essas sociedades dos tentáculos do imperialismo e como produzir um novo sistema político, económico e social a meio de um cerco do imperialismo mundial?
Este é o tipo de perguntas a que qualquer partido revolucionário deveria fornecer uma resposta. Um partido cujo objectivo seja fazer a revolução deveria analisar as limitações e ilusões dos actuais movimentos e deveria despertar e liderar as massas para desafiar o sistema no seu todo. E abrir caminho a novos desenvolvimentos e à propagação de uma corrente comunista revolucionária nesta região.
Em geral, poder-se-ia dizer que os países do Médio Oriente e Norte de África necessitam do tipo de revolução a que Mao chamou de Revolução de Nova Democracia. Trata-se de uma revolução liderada pelo proletariado e pelo seu partido de vanguarda. Ela esmagará os grilhões do feudalismo bem como do capitalismo ligado ao sistema capitalista mundial e instaurará o socialismo. Esta revolução estabelecerá uma política de Nova Democracia, uma economia de Nova Democracia e uma cultura de Nova Democracia que abrirá caminho ao estabelecimento de uma sociedade socialista - uma sociedade que lute pelo comunismo mundial. Nessa sociedade, a produção irá proceder de uma forma tal que resolverá os problemas da pobreza e das divisões, a favor de centenas de milhões de operários, camponeses, professores e mulheres e homens desempregados. E não ao serviço da acumulação de riqueza dos bandos estatais e dos que os apoiam. Na nossa sociedade, a opressão dos grandes proprietários rurais sobre os camponeses, dos capitalistas sobre os trabalhadores, dos homens sobre as mulheres e das grandes nações sobre as pequenas serão abolidas. A cultura de obediência será substituída pela cultura de liberdade de expressão e pelas rebeliões contra a injustiça e contra tudo o que é reaccionário. E a superstição será substituída pela expansão da perspectiva científica e pela procura da verdade, as quais serão usadas para mudar o mundo. O objectivo desta revolução não é obter direitos iguais dentro da ordem imperialista mundial - o que de qualquer forma não é possível nos países que têm estruturas dependentes e dominadas. O desenvolvimento económico que é implementado pelo Banco Mundial e pelo FMI nesta região e em qualquer outro canto do mundo é anti-povo, explorador e opressor. Sem esmagarmos os grilhões da dependência ao sistema capitalista mundial, não poderemos estabelecer as fundações de uma nova economia que sirva as necessidades do povo e o desenvolvimento de uma economia nacional coerente (e não desequilibradas). A nova democracia é um pequeno período de transição para uma sociedade radicalmente nova - i.e., o socialismo. Só o socialismo pode afastar as nossas sociedades do capitalismo mundial. O desenvolvimento económico de uma sociedade futura não será comandado pela “mão invisível do mercado” mas sim guiado conscientemente pelo estado socialista e pelas massas populares. As perguntas “Que produzir, como produzir, para quem e para quê” obterão respostas claras com um carácter de classe definido. A iniciativa colectiva dos operários, camponeses e profissionais da sociedade será decisiva para o desenvolvimento desta nova economia e não a importação de capital e tecnologia estrangeira. A economia será baseada na mobilização social e propagará os valores socialistas e internacionalistas. Em suma, qualquer aspecto do desenvolvimento económico, qualquer forma de organização económica, qualquer forma de organização do processo produtivo, serão determinados pelo objectivo de anular as distinções de classe, as relações exploradoras de produção e as distinções sociais como a opressão das mulheres e a opressão nacional e o desenvolvimento desigual de diferentes regiões.
Sobre a possibilidade da revolução
Essas pequenas forças que têm conseguido despertar e organizar um sector do povo também podem derrotar as aparentemente invencíveis forças dos estados reaccionários e das potências imperialistas e levar a revolução à vitória. O funcionamento do sistema capitalista intensificou as suas contradições e lançou-o para graves crises. Uma crise pode propagar-se a outros cantos e alargar enormemente as fendas e fissuras nas suas estruturas e instituições dominantes. Em pouco tempo, as crises irão revelar a realidade da horrenda opressão e exploração de centenas de milhões de pessoas e irão levá-las à acção. As crises irão expor a natureza reaccionária dos partidos políticos traidores a uma velocidade surpreendente e irão destruir a legitimidade deles aos olhos das massas populares. As crises intensificam as disputas e querelas internas entre os inimigos. Tudo isto de mãos dadas, tornará muito difícil e por vezes impossível o controlo da situação para as classes dominantes. Neste tipo de condições, pequenas forças revolucionárias que sejam realmente revolucionárias - i.e., que tenham um programa para uma mudança política, económica e cultural radical - podem tornar-se num pólo entre as massas indignadas e fazer do seu programa a reivindicação e o desejo de milhões de pessoas prontas a lutar por ele com as suas vidas nas suas mãos.
Estamos a viver uma época desafiadora. O sistema capitalista comete crimes a uma escala sem precedentes e a sua natureza putrefacta fica constantemente a descoberto. O capitalismo destrói constantemente as fronteiras e move enormes populações de um extremo ao outro do globo e integra-as no seu caldeirão em ebulição. Onde quer que os proletários estejam - nas catacumbas do Dubai, nos guetos da América ou nas minas chinesas, nas refinarias francesas ou nos campos petrolíferos de Ahwaz, na Líbia, na Argélia... Qualquer que seja a nossa nacionalidade: bengalis, paquistaneses, curdos, palestinianos, egípcios, cabiles, árabes, turcos... nós somos uma única classe mundial. Somos todos escravos do sistema capitalista mundial. Unamo-nos e coloquemos o comunismo e a revolução no palco central desta região e tornemo-nos nos arautos da emancipação humana. Celebremos o novo capítulo que foi aberto pelos povos dos países do Médio Oriente e Norte de África e tentemos arduamente içar a bandeira vermelha do internacionalismo proletário no seu cume.
Partido Comunista do Irão (Marxista-Leninista-Maoista)
Maio de 2011